sexta-feira, 17 de setembro de 2010

COMPANHIA MAGNÉTICA NO RÁDIO (50)

Então, tá, moçada, chegamos a 50 programas! E justo no fim de semana em que completamos também um ano no ar - em 19 de setembro do ano passado, COMPANHIA MAGNÉTICA foi ao ar pela primeira vez na FM CULTURA. Neste sábado, 22h, na 'Rádio Pública dos Gaúchos' - 107.7 no dial ou www.fmcultura.com.br -, tem dois especiais, um dos lançamentos mais bacanas do ano e várias presenças femininas de respeito. Enjoy!

1º bloco:

MOUNTAIN MAN – Soft Skin
Trio feminino americano de Vermont, formado pelas estudantes de artes Molly Erin Sarle, Alexandra Sauser-Monning e Amelia Randall Meath, formado no final dos anos 2000. Tem apenas um álbum, ‘Made The Harbor’, lançado em junho, em que as três dividem as composições, bastante influenciadas pela tradição folk americana, tanto em termos de melodia quanto de imagens. Algumas canções, inclusive, são interpretadas à capela.

VIVIAN GIRLS – Tension
Outro trio feminino americano, cultuado, este é do novaiorquino do Brooklyn, mas de proposta sonora bem diferente: fazem um pop lo-fi garageiro com referências que vão de Raincoats a Black Tambourine. Começaram a chamar atenção em 2008, com seus primeiros singles, lançados por pequenos selos independentes. O álbum de estreia, homônimo, veio no mesmo ano de 2008, e o seguindo e até agora último, ‘Everything Goes Wrong’, em setembro do ano passado. A formação do grupo teve uma alteração recente: a baterista Ali Koehler saiu para tocar com o Beach House e foi substituída por Fioan Campbell. As outras duas integrantes são as mesmas: Cassie Ramone (guitarra e vocais) e Kathy Goodman, também conhecida por Kickball Kathy, baixista e também vocalista. As duas têm projetos paralelos: a primeira toca num grupo chamado The Babies, já com dois singles na praça, com o baixista dos Woods, e a segunda tem um projeto-solo chamado La Sera, cujo disco sai em novembro, e outro, All Saintes Day, com um dos músicos da Cat Power.

HOPE SANDOVAL & THE WARM INVENTIONS – Wild Roses
Gatona de voz doce e melancólica, filha de americanos e mexicanos, cresceu em East Los Angeles, fez fama no mundo do rock alternativo com vocalista do Mazzy Star, um dos pioneiros do som slowcore dos anos 1990, tem 44 anos de idade, e muita história pra contar: pencas de colaborações com gente bacana – Chemical Brothers, Death In Vegas, Massive Attack, Air – e um namoro com William Reid, do Jesus And Mary Chain, banda com a qual também gravou. Formou o Hope Sandoval & The Warm Inventions ainda em 2000, já que o MS encontra-se em standby desde 1997, com o baterista Colm Ociosoig, ex-My Bloody Valentine, lançando no mesmo o E.P. ‘At The Doorway Again’, e no ano seguinte o álbum ‘Bavarian Fruit Bread’. O segundo disco só veio no ano passado, ‘Through The Devil Softly’.






2º bloco: MODEST MOUSE – ‘The Moon In Antarctica’ (2000)

Completando dez anos de lançamento um dos discos mais importantes de uma das melhores bandas americanas dos últimos quinze anos, o Modest Mouse de Isaac Brock, um dos vocalistas e compositores mais peculiares que há no mercado há tempos. ‘The Moon & Antarctica’ é o terceiro álbum de carreira do MM, lançado em junho de 2000, o primeiro por uma grande gravadora – a Epic Records –, e junto com o anterior, ‘Lonesome Crowded West’ (1997), o melhor de sua discografia. Se o anterior tinha a aspereza característica do início dos primeiros trabalhos do grupo, ‘The Moon ...’ já se caracteriza por uma placidez, climas acústicos, um certo suíngue herdado dos Talking Heads, além de instrumentos antes pouco comuns ao som dos caras – que ate´então eram basicamente uma guitar band –, como piano, cellos. Mas o estranhamento continua intacto.

‘The Moon & Antarctica’ já havia sido relançado em 2004, com quatro faixas-bônus – gravações da banda para a BBC –, e este ano ganhou versão em vinil duplo em abril, e nova edição em CD em agosto, mas sem novidades. À época de seu lançamento, o disco chegou a ser comparado a ‘Ok Computer’, o antológico álbum do Radiohead.

O Modest Mouse ainda era um trio naquela época, composto por Brock (guitarra e vocais), Jeremiah Green (bateria) e Eric Judy (baixo). Depois, sua formação foi inchando até chegar ao quinteto atual – acrescido por um terceiro guitarrista, Jim Fairchild, nas apresentações ao vivo. Johnny Marr, ex-Smith, participou do último álbum, ‘We Were Dead Before the Ship Even Sank’ (2007) e tocou com o grupo até o ano passado, quando decidiu juntar aos ingleses The Cribbs. Os outros integrantes são Joe Plummer, baterista, e Tom Peloso, guitarrista e baixista.

3rd Planet
Gravity Rides Everything
Dark Center of the Universe
Tiny Cities Made Of Ashes
Paper Thin Walls






















3º bloco: BIRTHDAY PARTY – ‘Junkyard’ (1982)

Mítica, seminal, sombria e barulhenta banda australiana de Melbourne, formada em 1976, responsável por apresentar ao mundo o carismático cantor e excelente compositor Nick Cave, que a partir de 1983 tornou-se, com o auxílio dos seus Bad Seeds, uma das personalidades mais marcantes do pós-punk. As histórias de culpa sem direito a redenção, violência, perversidade, religião, amor e morte de Cave fizeram dele um clássico moderno, e esse talento narrativo ele levaria depois para a literatura e até para o cinema.

Nicholas Edward Cave nasceu em 22 de setembro de 1957 – completa 53 anos na próxima quarta-feira, portanto – em Wangaratta, no estado de Victoria, na Austrália, e criou-se em um ambiente familiar propício para o desenvolvimento artístico: se pai, professor, era apaixonado por literatura, sua mãe, bibliotecária, e o avô, radialista e produtor de documentários. Cantou em coros de colégio, mas rebelou-se contra as autoridades dos colégios pelos quais passou, e mais tarde praticaria alguns atos de delinquência bem no momento em que seu pai morria de acidente de carro, o que causaria impacto profundo e duradouro em sua já atormentada existência. Estudou arte por pouco tempo, largando a universidade para dedicar-se à carreira musical. Sua primeira banda, The Boys Next Door, formada em 1973, tinha, além dos seus vocais, a guitarra de Mick Harvey – seu escudeiro até hoje –, e a bateria de Phill Calvert, ambos colegas de escola. O baixista Tracey Pew entraria em 1975, último ano escolar dos caras no colégio, e o guitarrista Rowland S. Howard, em 1978. Esta seria a formação clássica do Birthday Party, nome adotado pelos caras quando da mudança para Londres, para onde mudaram-se em 1980, e inspirado no título de uma peça do dramaturgo inglês Harold Pinter.

Cave sempre foi a figura mais marcante do grupo, mas foi com a entrada de Howard que o som do Birthday Party tomou forma definitiva: se antes os caras soavam como uma banda típica da new wave com referências do proto-punk dos Stooges e dos conterrâneos The Saints e Radio Birdman, com a adição de Howard o som do BP, além de tornar-se ainda mais agressivo e ruidoso, passou a incluir elementos do free jazz, do rockabilly e mergulhou ainda mais fundo na influência do blues – também uma referência decisiva para Nick Cave. E o múlti-instrumentista, arranjador e produtor Mick Harvey (Michael John Harvey, nascido em 29 de setembro de 1958), que depois acompanharia Nick Cave nos Bad Seeds, gravaria trilhas sonoras e participaria de outra banda, o Crime + The City Solution, contibuía com sua guitarra concisa para o som minimal do grupo – a dramaticidade e sofisticação dos Bad Seeds também devem muito a ele.

O Birthday Party lançou três álbuns – ‘The Birthday Party’ (1980, então creditado ainda a The Boys Next Door), ‘Prayers On Fire ‘ (1981) e ‘Junkyard’ (1982) –, e vários singles e E.P.s. O derradeiro disco, ‘Junkyard’, trouxe alterações significativas na formação do grupo: o baterista Calvert foi chutado pelos companheiros de banda por que os caras acharam que ele não era capaz de tocar satisfatoriamente o ritmo frenético de ‘Dead Joe’, sendo substituído nas gravações por Harvey. Tracy Pew, o baixista, foi preso por dirigir alcolizado, vindo a passar três meses na cadeia, sendo substituído pelo ex-Magazine Barry Adamson – outro que tocaria nos Bad Seeds de Nick Cave depois. Mas outros problemas já ameaçavam a continuidade dos trabalhos: as diferenças entre Howard e Cave tornavam-se cada vez mais evidentes, e o abuso de drogas tmabém já cobravam a conta. A banda, com mais mudanças na formação – o alemão Blixa Bargeld, líder do Einstürzende Neubauten e mais um a integrar os Bad Seeds na sequência, tocou guitarra na última turnê – resistiria pouco.

Em 1983, anunciou sua dissolução. Mas o estrago já tava feito: a influência do blues gótico e noisy do Birthday Party permaneceria como referência para inúmeras bandas de variados estilos: My Bloody Valentine, LCD Sound System, Dinosaur Jr., 16 Horsepower, Cocteau Twins, Gogol Bordello, Jesus And Mary Chain, Deerhunter ... todos assumem com orgulho a influencia de Cave, Howard, Harvey e companhia.

Blast Off
She’s Hit
Dead Joe
Kiss Me Black
Release the Bats

COMPANHIA MAGNÉTICA NO RÁDIO (49)

O playlist do programa da semana passada, pra registro. Em instantes, o de amanhã - o 50º!

1º bloco:

OBERHOFER – I Could Go
É cria de um garoto chamado Brad Oberhofer, de apenas 19 anos, que nem álbum completo tem ainda: tem apenas alguns singles, que já viraram objeto de culto entre o povo indie, um E.P., recém-lançado, ‘o0Oo0Oo’, e vídeos feitos pelos próprios caras e postados no Youtube e no MySpace. Oberhofer é orinudo de Tacoma, Washington, e começou a gravar seu material na casa dos pais mesmo, antes de se mudar pro Brooklyn, em Nova Iorque, pra um apartamento que faz pouco tempo andou incendiando – mas pelo menos os caras conseguiram salvar o sofá e um arquivo com algumas gravações.

WILD NOTHING – Chinatown
Banda novíssima, formada no ano passado, por Jack Tatum, ex-Jack and the Whale e Facepaint, faz um pop indie inspirado na famosa ‘class of 86’ – as bandas inglesas de meados dos anos 1980 que faziam um som melodioso e despojado, inspirado nos Smiths, tipo The Loft, Pastels e Shop Assistants. O Wild Nothing, que chamou a atenção com uma versão de ‘Cloudbusting’, de Kate Bush, tem apenas dois singles e um álbum, ‘Gemini’, lançado este ano.

THE MICROPHONES – The Moon
Banda cult americana de Olympia, Washington, berço da mítica gravadora K Records, que lançou todos os seus discos, assim como das outras bandas do líder Phil Evrum, D+ e Old Time Relijun. Fazia um som lo-fi muito bacana, por vezes barulhento, por vezes delicado, falando de amores perdidos ou sobre as memórias da infância. Evrum, que começou a tocar nos anos 1990 em uma banda chamada Anacortes, anunciou o fim dos Microphones em 2004 pra iniciar outro projeto chamado Mount Eerie, mas dois anos depois lançou um disco usando novamente o nome da antiga banda, de modo que desde mais ou menos 2007 não se sabe se os Microphones ainda vivem ou não. De qualquer maneira, o álbum de 2001, ‘The Glow Pt. 2’, segue sendo um dos mais festejados do som alternativo da década.



2º bloco:

MELVINS – Evil New War God
Patrimônio da barulheira, uma das principaisbandas do rock americano dos últimos 25 anos, passaram à história não apenas pelo brutal mix de Black Sabbath, punk rock e experimentalismos, mas por serem uma das principais inspirações do grunge, em especial do Nirvana – Kurt Cobain não apenas era fã de carteirinha, como acabou virando produtor do grupo. Estão na estrada há 25 anos, são da mesma Aberdeen, no estado de Washington, onde nasceram Cobain e seu parceiro Krist Novoselic. Apesar da força de Kurt e do estouro do Nirvana ter aberto as portas para um sem-número de bandas, os Melvins não duraram muito no universo das grandes gravadoras: após excelentes serviços prestados à causa indie, assinaram com a Atlantic no começo dos 90’s, mas foram dispensados após três discos – um deles, justamente ‘Houdini’ (1993), produzido por Kurt. Voltaram ao gueto independente, e desde então gravam pela Ipecac Records, selo de propriedade do maluco Mike Patton, vocalista do Faith No More. A última porrada é o recém-lançado ‘The Bride Screamed Murder’. Na atual formação, além dos sócios-fundadores Dale Crover (bateria) e Buzz Osbourne (guitarra e vocal), há ainda Jared Williams (baixo e vocais) e um segundo baterista, Coady Williams.

TAD – Jinx
Uma das bandas que mais claramente foi influenciadas pelos Melvins – e também pela Gang Of Four, pelo Killing Joke e pelo Birthday Party. A mais escrotona das bandas do grunge de Seattle, durou exatos dez anos – de 1988 a 1998 –, começou gravando pela Sub Pop, passou por outras gravadoras – entre eles, a Elektra –, deixou apenas 5 álbuns, até seu vocsliasta, Tad Doyle, decidir formar outro grupo, o Hog Molly, que lançou apenas um disco e também desapareceu. Mais tarde, Tad teria outras duas bandas, Hoof e Brothers of Sonic Cloth, seu projeto atual. O rotundo Tad, além de grasnar suas brutais composições, na companhia de Gary Thorstensen (guitarra), Kurt Danielson (baixo) e Steve Weid (bateria, depois substituído por Josh Sinder), tinha como profissão a atividade de açougueiro. ‘8-Way Santa’, o segundo álbum, de 1991 – produzido pelo mesmo Butch Vig que pilotou as picapes de ‘Nevermind’, do Nirvana, no mesmo ano, é o melhor disco do Tad.

WAYNE COUNTY & THE ELECTRIC CHAIRS – Storm The Gates of Heaven
Figuraça da cena novaiorquina dos anos 1970, Wayne Rogers, nascido em 13 de julho de 1947 (tem 63 anos de idade, portanto) em Dallas, na Georgia, entrou para os anais da história por ser, se não o primeiro, o mais famoso transexual do meio. Atuou em vários filmes dirigidos por Andy Warhol e assumiu seu nome de guerra em um espetáculo chamado ‘Femme Fatale’. Em 1972, fazia performances vestido de drag no lendário Max’s Kansas City e já cantava com o aopio de uma banda curiosamente chamada The Back Street Boys, mas como não arrumava gravadora, mudou-se para Londres, onde registrou seu primeiro álbum, ‘The Electric Chairs’, em 1977, ano do estouro punk na ilha. Ainda mudaria-se pra Berlin – onde transformou-se de Wayne em Jane – até voltar pra América em 1980. Um de seus registros clássicos é ‘Storm the Gates of Heaven’, de 1978.










3º bloco: AMERICAN MUSIC CLUB – ‘Everclear’ (1991)

Cultuada e prolífica banda californiana de San Francisco, durou 12 anos, deixou 9 álbuns, revelou um excelente compositor, mas sua trajetória, ainda que amplamente respaldada pela imprensa especializada – em 1991, o vocalista Mark Eitzel foi eleito “compositor do ano” pela Rolling Stone –, não foi muito diferente da maioria das bandas indie das três últimas décadas: sua passagem pelo mainstream foi discreta, e num dado momento os caras decidiram se separar. Mas assim como a maioria das bandas cult, beneficiaram-se com a aura criada em torno de si, e acabaram decidindo voltar dez anos depois.

Tudo começou em 1983, quando o itinerante John Mark Eitzel, depois de perambular por Okinawa, Taiwan, Reino Unido e Ohio, volta para sua San Francisco natal. Antes de unir-se ao guitarrista Scott Alexander, ao baterista Greg Bonnell e ao baixista Brad Johnson e fundarem o American Music Club, Eitzel lançara dois singles com outras duas bandas, The Cowboys e The Naked Skinnies. O AMC teria algumas mudanças de formação, mas seu núcleo básico se consolidaria com Eitzel, Danny Pearson (baixo), Matt Morelli (bateria), Brad Johnson (transefiro para os teclados) e o guitarrista Vudi. Os dois primeiros álbuns, ‘The Restless Stranger’ (1985) e ‘Engine’ (1987) chamaram a atenção para o ecletismo sonoro e as composições de Eitezl, mas foi só no terceiro, ‘California’ (1988), que o grupo firmou-se como uma das forças do underground americano, a essas alturas apoiado também nas caóticas apresentações do grupo: apesar da aparente calmaria das canções – o AMC é um dos inventores do chamado slowcore –, Eitzel, alcóolatra desde os 14 anos, frequentemente desafiava seus demônios em pleno palco, com resultados absolutamente imprevisíveis.

O álbum seguinte, ‘United Kingdom’, curiosamente seria lançado apenas no Reino Unido, como o título já sugere, embora tenha sido todo gravado em um hotel de San Francisco. E o quinto pôs definitivamente os nomes dos caras em destaque: ‘Everclear’ foi eleito álbum do ano pela Rolling Stone e Eitzel o melhor compositor. Mas em termos de resultado prático, nada mudou muito. É eitzel quem recorda: “Eu lembro que estávamos na Alemanha quando soubemos da eleição da Rolling Stone, e aquilo me fez realmente bem. Mas no próximo show haviam apenas 20 pessoas na platéia, e eram caras do exército, que acharam que pelo nome – ‘Clube Americano de Música – fôssemos uma espécie de ‘American Freedom-Fighters’”. O fato é que o grande público não se sensibilizou com canções como ‘Rise’, uma candidata a hit que teve alguma rotação no 120 Minutes (o ‘Lado B’ da MTV americana) nem com canções como ‘Sick of Food’, uma das mais pungentes músicas sobre o drama da AIDS, e o álbum não teve maior repercussão. Lançariam apenas mais um disco, ‘San Francisco’, em 1994, e então desistiram.

Voltaram em 2004 com ‘Love Songs For Patriots’, sucedido por ‘The Golden Age’, lançado há dois anos. Quem sabe, agora vai.


Why Wont’t You Stay
Rise
Crabwalk
The Confidential Agent
Sick Of Food

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

COMPANHIA MAGNÉTICA NO RÁDIO (48)

Conforme o prometido, o programa deste sábado, dia 4, às 22h na FM CULTURA (107.7 no dial ou www.fmcultura.com.br) é um especial com os Pogues de Shane McGowan, com material dos dois principais discos da banda.


1º bloco: ‘Rum, Sodomy and Lash’ (1985)

Uma das raras unanimidades no pós-punk europeu, um grupo que não apenas tinha conceito entre os punks – afinal, começou inspirado no Clash –, como entre o pessoal de gerações anteriores: Tom Waits é seu fã, Bob Dylan convidou-os para abrir uma turnê sua. Unindo o punk à música tradicional irlandesa, os Pogues legaram também ao rock uma dos frontmen mais carismáticos, talentosos e atormentados dos últimos 30 anos.

Shane Patrick Lysaght MacGowan nasceu em 25 de dezembro de 1957 em Pembury, Kent, Inglaterra, de pais irlandeses, e cresceu justamente imerso na cultura do país vizinho – sua mãe, por exemplo, era cantora e dançarina da tradicional música irlandesa. Aos 14 anos, Shane ganhou uma bolsa de estudos na renomada Westminster School, mas acabaria sendo esxpulso no segundo ano por posse de drogas – e o convívio com os abusos químicos seria um problema que o acompanharia para sempre: Shane conta que começou a beber aos 4 anos de idade, com uma tia, e mais tarde, cultivaria o vício em heroína também. O que não o impediria de desenvolver sua carreira musical. Inspirado no Clash, participou de uma banda punk chamada Nipple Erectors, que mudaria seu nome para Nips depois. Com o fim desse grupo, formou os Pogues em 1982, com um cara que viu tocando flauta celta numa estação de metrô, Spider Stacy. Inicialmente, deram à banda o nome de Pogue Mahone – que no dialeto gaélico irlandês significa “kiss my ass” (“beije meu rabo”) –, logo mudado simplesmente para The Pogues, pra evitar boicote de emissoras de rádio e TV. Além de Shane e Spider, a primeira formação dos Pogues tinha o antigo guitarrista dos Nips, Jim Fearnley, o baterista Andrew Ranken, a baixista Cait O'Riordan, e Jem Finer, que tocava guitarra e banjo.

Os primeiros shows dos Pogues foram nas ruas e em tradicionais pubs irlandeses de Londres, e os caras tocavam basicamente canções tradicionais da Irlanda, mas logo as composições de Shane foram ganhando espaço. Assim como a música, a selvageria das apresentações ia ganhando fama – não era raro Shane subir ao palco totalmente embriagado. O primeiro single do grupo, independente, viria no começo de 1984, ‘Dark Streets of London’, e em seguida os Pogues já estariam abrindo uma turnê do Clash. Também não tardaria a aparecerem gravadoras interessadas, e a banda assinaria com a Stiff Records, histórica gravadora que lançou o primeiro single (‘New Rose’) e o primeiro álbum (‘Damned, Damned, Damned’) do punk britânico, ambos do Damned, e tinha no catálogo também Ian Dury e Elvis Costello. ‘Red Roses For Me’, o primeiro álbum, veio no mesmo ano de 1984, e continha canções clássicas do grupo, como o citado single de estreia e ‘Streams of Whisky’, mas os discos que fariam dos Pogues uma das bandas mais importantes do rock nos anos 1980 seriam os dois seguintes.

The Sickbed of Cuchulainn
The Old Man Drag
A Pair Of Brown Eyes
Sally MacLennane
Dirty Old Town
The Band Played Waltzing Matilda



2º bloco: ‘If I Should Fall From Grace With God’ (1988)

Transformado em septeto, com a entrada de mais um guitarrista, Phil Chevron, os Pogues lançariam em 1985 o disco que os estabeleceria como um dos grandes grupos de sua época. Produzido por Elvis Costello – que declarou que logo percebeu que sua tarefa era “capturá-los em toda sua glória decadente, antes que um produtor profissional os ferrasse” – e tirando seu título de uma frase falsamente atribuída a Winston Churchill sobre as verdadeiras tradições da Real Marinha Britânica – “Não me fale sobre tradição naval. Não é nada mais do que rum, sodomia e chicote” –, ‘Rum, Sodomy and Lash’ trazia um Shane MacGowan ainda mais inspirado como compositor, e uma banda afiadíssima. Há algumas versões para temas tradicionais, como no primeiro disco, mas aqui as canções próprias, como ‘The Sick Bed Of Cúchullaín’, ‘The Old Man Drag’ e ‘A Pair Of Brown Eyes’ tomam à frente. O disco fez sucesso dos dois lados do Atlântico, sendo adotado pelas college radios americanas. A capa também é um clássico: traz a obra ‘A Balsa da Medusa’, do francês Théodore Géricault, em que mostra alguns dos sobreviventes da fragata Medusa, que colidiu com um banco de areia navegando na costa oeste africana em 1816. Os rostos dos pobres tripulantes, que se amontoaram na referida balsa improvisada, sendo levados inexoravelmente à fome, ao canibalismo e ao desespero, foram trocados pelos integrantes dos Pogues.

Mas o grupo não soube aproveitar o momento de sucesso – se bem que também foram atrapalhados por algumas circunstâncias alheias à sua vontade: recusaram-se a gravar um novo álbum – o terceiro só sairia três anos depois –, sofreram um desfalque sério – a baixista O’Riordan casou com Elvis Costello e pulou fora –, a Stiff faliu. E os hábitos autodestrutivos de Shane começavam a atrapalhar o trabalho: se antes ele subia ao palco bêbado, agora simplesmente não aparecia mais, o que levou os caras a terem de cancelar várias datas. Mas a fama crescia: Shane e Cait atuaram em ‘Straight to Hell’, do diretor inglês Alex Cox e várias canções do grupo foram incluídas na trilha sonora do filme, em 1987. No ano seguinte, eis que surge o aguardado sucessor de ‘Rum, Sodomy and Lash’: produzido por Steve Lillywhite, ‘If I Should Fall From Grace With God’ traria a mais conhecida música dos Pogues, também considerada por alguns a melhor canção de Natal de todos os tempos, ‘Fairytale of New York’, um dueto de Shane com Kirsty MacColl, além de outros clássicos, como a faixa-título, ‘Turkish Song of The Damned’ e ‘Thousands Are Sailing’. O álbum, que diversificava as referências sonoras da banda – as influências agora vinham também da música espanhola, do jazz, e do leste europeu –, chegou ao número 3 da parada britânica e fez belíssima figura nos charts americanos, assim como o seguinte, ‘Peace and Love’, mas nada disso foi suficiente para segurar Shane, que bebia cada vez mais. Resultado: acabou sendo demitido do grupo que fundou em 1991.

Os Pogues ainda tentaram se virar sem seu marcante homem de frente por alguns álbuns – ‘Hell’s Ditch’ (1990), ‘Waiting For Herb’ (1993), ‘Pogue Mahone’ (1996) –, com Spider e Jem dividindo-se nos vocais, enquanto que nas turnês era o ex-líder do Clash, Joe Strummer, quem fazia o papel de Shane. Mas logo ficou claro que sem ele não tinha mais graça, e a banda anunciou sua dissolução em 1996. Voltariam em 2001 para uma tour pelo Reino Unido e desde então reunem-se esporadicamente, sem pretensões de gravar material inédito, segundo Spider. Pelo menos por enquanto.

If I Should Fall From Grace With God
Turkish Song of The Damned
Bottle of Smoke
Fairytale of New York
Thousands Are Sailing
Lullaby of London


PS - 'Rum, Sodomy and Lash', mais o álbum de estreia, 'Red Roses For Me', os derradeiros disco com Shane, 'Peace and Love' e 'Hell's Ditch', estão finalmente sendo lançados no mercado nacional, pela série "Best Sellers" (?) da Warner, a um precinho bem camarada, menos de 20,00 cada. Mais: além dos Pogues, a tal série traz os gloriosos discos iniciais de Tom Waits, clássicos de Joni Mitchel, o excelente 'Bummed', dos Happy Mondays (em edição especial), a antológica estreia de Crosby, Stills and Nash, o primeiro registro solo de David Crosby, além de bons álbuns de Ramones, Lou Reed, Alice Cooper, Dinosaur Jr., Aretha Franklin. Assim, a vida fica mais legal.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

COMPANHIA MAGNÉTICA NO RÁDIO (47)

Tá aí o playlist do programa do último fim-de-semana. O próximo é um Especial inteirinho dedicado aos Pogues de Shane McGowan. Enjoy!


1º bloco:

ARIEL PINK’S HAUNTED GRAFFITI – Round And Round

Curioso grupo californiano de Los Angeles, na estrada desde 1996, obra do múlti-instrumentista, cantor e compositor Ariel Pink, um sujeito que recebe influências tanto da vanguarda do rock dos anos 1970 – Bowie, Roxy Music, Frank Zappa – quanto do pop radiofônico mais trivial, além do som da new wave dos anos 1980. Os primeiros dois discos do Haunted Graffiti, ‘Theb Doldrums’ (1999) e ‘Vital Pink’ (2000) foram gravados em esquema caseiro e não foram parar nas lojas: eram cópias caseiras, que Ariel Pink tirava do seu computador e fazia circular por aí. Só em 2004 é que o cara foi assinar um contrato com uma gravadora – no caso, a Paw Tracks, do pessoal do Animal Collective; o Haunted Graffiti, aliás, acabou sendo sendo a primeira banda fora do grupo do Animal Collective assinar com o selo. O mais recente álbum, ‘Before Today’, lançado em junho, já encontra o Ariel Pink’s Haunted Graffiti em novo lar, o lendário selo britânico 4AD, e é um dos mais elogiados discos do ano até aqui.

TAME IMPALA – Solitude Is Bliss
Grupo australiano muito bacana, formado em Perth em 1999, quando seus dois homens de frente, o vocalista e guitarrista Kevin Parker e o baixista Dominic Simper tinham apenas 13 anos. Foi só em 2007, com a entrada do baterista Jay Watson, que os caras resolveram tirar a cara pra fora da toca. O grupo é mais um que soube usar as modernas ferramentas da comunicação: chegou a ser disputado por várias gravadoras após postar músicas no seu endereço no MySpace, e quem acabou mordendo a isca foi a Modular Records, que mandou um e-mail pros caras depois de conhecer o som, e recebeu de volta uma demo com 20 canções. Em 2008, veio um E.P. homônimo e neste ano o álbum de estreia, ‘Innerspeaker’. O som dos caras busca suas principais referências na psicodelia do final dos anos 1960 – Hendrix, o Pink Floyd de Syd Barrett.

TITUS ANDRONICUS – A More Percfect Union
Grupo americano de Glen Rock, New Jersey, fundado em 2005, tirou seu nome de um lendário navio da marinha americana, e com dois álbuns no currículo: ‘The Airing of Grieviances’, de 2008, que faz referência a um episódio de Seinfeld, e ‘The Monitor’, deste ano. As influências vão de baluartes do indie rock como Pixies e Bright Eyes, a cantores e compositores clássicos do rock americano como Bruce Springteen. O novo disco tem uma penca de convidados, como o pessoal de bandas bacanas como as Vivian Girls, o Ponytail, os Felice Brothers e o Hold Steady, entre outros, e requintes como o uso de trombones, cellos, violinos e gaitas de fole, contrastando com seu som simples e enérgico, de verniz punk. ‘The Monitor’ é outro álbum entre os mais elogiados de 2010.


2º bloco:

J MASCIS + THE FOG – Where’d You Go

Mítica figura do rock americano das últimas três décadas, o hoje grisalho frontman do Dinosaur Jr., prestes a completar 45 anos de idade, natural de Amherst, Massachussets, um dos caras que revitalizou o uso da guitarra na cena indie, curiosamente começou tocando bateria, num grupo hardcore formado na adolescência com seu futuro parceiro de Dinosaur, Lou Barlow. Após desativar o grupo em 1997, formou nova banda, passando a se apresentar como J Mascis + The Fog, que deixou apenas dois álbuns, ‘More Light’ (2000) e ‘Free So Free’ (2002), antes de J fazer as pazes com Lou Barlow e reativar o Dinosaur. – antes, já havia gravado um disco solo acústico, chamado ‘Martin + Me’, em 1996. A personalidade do cara é tão marcante que qualquer um de seus projetos, além da qualidade, traz sua marca evidente, tanto nas composições, com sua dinâmica particular, equilibrando melodia e barulho, quanto nos vocais largadões e no modo de tocar guitarra, entre o groove, a melodia e o esporro. ‘More Light’, do The Fog, tem co-produção do não menos mítico Kevin Shields, do My Bloody Valentine.

BELLRAYS – That’s Not The Way It Should Be
Grande banda californiana de Riverside, na estrada há aproximadamente 20 anos, é o projeto de um casal: Bob Venuum, originalmente guitarrista, depois tornado baixista, e sua mulher, a vocalista Lisa Kekoula, dona de um vozeirão que lembra algumas das maiores divas da soul music. O som dos BellRays, profundamente enraizado no final dos anos 1960 – quando o rock ficava cada vez mais barulhento e a black music americana, mais envenenada –, geralmente é descrito como um mix do som protopunk de Detroit (Stooges, MC5) com e a voz das grandes soul ladies (tipo Aretha Franklin e Tina Turner). Dos vários álbuns lançados pelo grupo desde o ao vivo ‘Let It Blast’ (1999, o pontapé inicial, ao vivo), apenas o regular ‘Have a Little Faith’, de 2006, saiu no Brasil. O mais recente é ‘Hard, Sweet and Sticky’, de 2008, que equilibra bem a fúria dos primeiros discos, com o clima de r’n’b vintage e toques jazzísticos das gravações mais recentes.

HELLACOPTERS – Hopeless Case of a Kid In Denial
Quinteto sueco formado em 1994 que até já se apresentou em Porto Alegre, abrindo para Sepultura e Deep Purple, uns 7 anos atrás, também retira suas referências básicas do som protopunk – não apenas a música de Detroit dos Stooges e MC5, mas também os autralianos do Radio Birdman, além do hard rock do Cheap Trick. Por sinal, antes de penetrar no mercado americano via o mítico selo de Seattle Sub Pop Records, os caras primeiro tornaram-se cult na Austrália e em certos cantos da Europa. Têm vários álbuns lançados, e um dos mais bacanas é ‘High Visibility’, de 2002, o primeiro lançado no Brasil.


3º bloco: THE LIGHTNING SEEDS – ‘Cloudcuckooland’ (1989)/‘Sense’ (1992)/ ‘Jolification’ (1994)

Esta se encaixa direitinho naquele conceito de “banda de um homem só”: por muito tempo foi apenas um projeto do múlti-instrumentista e produtor inglês Ian Broudie, que sequer tinha vida fora dos estúdios de gravação. Só foi fazer sua primeira turnê em 1994, cinco anos após a fundação do “grupo”, pra divulgar o lançamento do terceiro álbum – mas o Lightning Seeds, a essa altura, já havia se estabelecido como um dos principais grupos do então emergente britpop, com sua melodias ensolaradas e referências que vão da psicodelia ao synthpop.

Brodie nasceu em Liverpool em 4 de agosto de 1958, e sua primeira banda mais ou menos conhecida foi o Big In Japan, lendário grupo punk da cidade que surgiu no final dos anos 1970 na mesma cena da qual emergiriam também os lisérgicos Echo & The Bunnymen e The Teardrop Explodes. Após o fim desse grupo em 1979, passou por outras bandas, como The Original Mirrors e Care, enquanto fazia fama como produtor: ele pilotou as pickups nos dois primeiros álbuns do Echo & The Bunnymen, ‘Crocodiles’ (1980) e ‘Heaven Up Here’ (1981), além de discos do The Fall e do Wah!. Foi em 1989, já com o primeiro single, ‘Pure’, que Brodie estabeleceu-se com o novo grupo, batizado de Lightning Seeds, que, assim como no curto período em que teve este projeto Care, era aklgo totalmente idealizado por ele mesmo, apenas contando com músicos de apoio, contratados. Mas nem o sucesso estrondoso da canção nas paradas, nem a boa repercussão do álbum de estreia, ‘Cloudcuckooland’, também de 1989, fez com que abandonasse sua atividade de produtor: bandas como The Primitives e Sleeper, além da cantora Alison Moyet devem boa parte de seu sucesso ao trabalho competente de Brodie na mesa de som.

No álbum seguinte, ‘Sense’ (1992), Brodie já contava com o auxílio do programador Simon Rogers, ex-The Fall, mas foi só em ‘Jolification’ (1994), que o cara decidiu montar sua primeira banda de verdade, para excursionar. Datam daí seus primeiros shows em dez anos, desde a época dos Original Mirrors. Em 1996 viria ‘Dizzy Heights’, em 1999, ‘Tilt’, e só no ano passado, quebrando um hiato de dez anos sem lançar nada, portanto, viria um novo álbum, ‘Four Winds’, já com a banda totalmente reformulada por Brodie.

All I Want
Pure
Sense
The Life of Reiley
Perfect

COMPANHIA MAGNÉTICA NO RÁDIO (46)

Só pra registro, o playlist do penúltimo programa, Especial com os MEAT PUPPETS. See Ya.


1º bloco:

Comemorando trinta anos de carreira em 2010, uma das mais míticas e longevas bandas americanas da cena indie dos anos 1980, um dos principais grupos do catálogo da não menos mítica gravadora californiana SST Records, e responsável pelo surgimento de um subgênero do pós-punk americano, o ‘cowpunk’, os Meat Puppets cumprem uma trajetória das mais peculiares e acidentadas do rock americano das últimas décadas: começaram tocando um hardcore mais ou menos corriqueiro, adicionando elementos da música de raíz americana, criaram um som único, ganharam as college radios americanas, conquistaram público fiel, esse público fiel torceu o nariz para eles quando o som passou a aproximar-se do mainstream, ganharam a sorte grande quando um certo Kurt Cobain convidou-os pra participar do Acústico MTV de sua banda, ganharam então as paradas do seu país, não seguraram a onda, um dos integrantes quase morreu por problemas com drogas, a própria banda morreu, mas ressuscitou tempos depois. Morreu de novo e viveu mais uma vez.

As origens do grupo remontam à adolescência dos irmãos Kirkwood, Curt (guitarrista) e Cris (baixista) em Phoenix, no Ariziona, onde começaram tocando em bandas de hard rock. O baterista Derrick Bostrom, que tinha uma invejável coleção de discos de punk rock no final dos anos 1970, tocava em uma banda chamada Atomic Bomb, que incluía Chris e gravou algumas demos. Os trÊs acabaram se juntando logo depois de formarem-se no high school. O primeiro nome escolhido foi The Bastians of Immaturity, logo trocado pra Meat Puppets, inspirado em um cartum. Tocavam um hardcore furioso, tocado o mais alto e sujo possível, que logo chamou a atenção de um olheiro da SST Records, gravadora de propriedade do guitarrista do Black Flag, Greg Ginn, que os contratou. Os primeiros discos, o E.P. ‘In a Car’ (1981), e o álbum de estreia, ‘Meat Puppets’ (1982), têm a marca do hardcore. A guinada viria no seguinte, ‘Meat Puppets II’ (1984), o indiscutível clássico do grupo.

In a Car (‘In a Car’ E.P., 1981)
Blue-Green God (‘The Meat Puppets’, 1982)
Split Myself In Two (‘The Meat Puppets II’, 1984)
Plateau (‘The Meat Puppets II’, 1984)
Lake Of Fire (‘The Meat Puppets II’, 1984)



2º bloco:

‘Meat Puppets II’, gravado em 1983, teve postergado seu lançamento pela SST em um ano, mas quando saiu logo causou sensação. À época, a banda já declarava estar cansada do hardcore, e tratou, então, de partir para novos rumos. Canções como as três que o Nirvana tocaria em seu Acústico da MTV com participação dos irmãos Kirkwood, dez anos depois – ‘Plateau’, ‘Lake of Fire’ e ‘Oh, Me’ –, além dos experimentos com o country & western, o folk, o blues rock e a psicodelia sessentista, garantiram a excelente repercussão do álbum, clássico absoluto da última grande geração do rock americano – aquela que se firmou no universo indie primeiro pra depois arrombar as portas do mainstream (R.E.M., Hüsker Dü, Sonic Youth, Replacements, um pouco depois o Dinosaur Jr.). No disco seguinte, a primeira controvérsia: ‘Up On The Sun’ deixava pra trás a pegada punk, aproximando-se do folk rock dos Byrds e do Buffalo Springfield, o que levou alguns fãs a acusarem os Puppets soarem perigosamente “parecidos com os hippies, traindo suas origens punk”. Mas esse terceiro disco do trio, com o passar do tempo, acabaria firmando como um dos melhores de sua carreira.

À época do E.P. ‘Out My Way’, porém, vem o primeiro percalço: em um acidente com a van da banda, Curt quebra um dedo, e o quarto disco, ‘Mirage’, de claras tinturas psicodélicas, só que mais acessível que os anteriores, é adiado pro ano seguinte. Em 1987, também sai ‘Huevos’, puxando mais pro hard rock e com influência evidente do blues rock do ZZ Top. Esse último é outro grande disco, trazendo uma banda afiada e gravado quase que de uma tacada só – a maioria das músicas foi registrada em um só take –, em poucos dias de gravação.

Enchanted Porkfist (‘Up On The Sun’, 1985)
Out My Way (‘Out My Way’ E.P., 1986)
Confusion Fog (‘Mirage’, 1987)
Get On Down (‘Mirage’, 1987)



3º bloco:

‘Monsters’, de 1989, com seus temas extendidos em jams e uma perigosa proximidade ao heavy metal, definitivamente desagradou aos fãs mais antigos, e também às normalmente militantes college radios: praticamente foi ignorado pelas emissoras universitárias americanas, basicamente o público cativo dos Meat Puppets. Seria o último álbum da banda pela SST: o trio foi contratado logo em seguida pela London Records, que lançaria os três discos do grupo nos anos 1990, ‘Forbidden Places’, de 1991, ‘Too High to Die’, de 1994, e ‘No Joke!’, de 1995. ‘Too High ...’, turbinado pela participação dos irmãos Kirkwood no Acústico do Nirvana, acabaria tornando-se o único álbum do grupo a figurar nas paradas, por conta do single ‘Backwater’, rendendo um disco de platina pelas mais de 500.000 cópias vendidas. ‘No Joke!’, talvez o disco mais fraco de todo o catálogo dos Meat Puppets, seria o último da formação original.

O envolvimento de Cris com vários tipos de drogas pesadas levaria o grupo a se separar em 1996, só voltando à ativa em 2002, e mesmo assim, à meia-boca: o baixista foi preso pelo entrevero com um segurança, que atirou em seu estômago, foi condenado e cumpriu pena, sendo solto em julho de 2005, mesma época em que o grupo resolveria pendurar as chuteiras mais uma vez. Mas seu calvário tava só começando: Cris ainda teria de encarar as mortes por overdose de sua mulher e outros amigos junkies, sumiu de vista, peramblulou como um zumbi por aí. Finalmente recuperado, voltou a seu antigo posto na nova volta dos Puppets, já sem Derrick, um ano depois, e desde então o reativado grupo lançou os álbuns ‘Rise to Your Knees’ em 2007 e ‘Sewn Together’ no ano passado. Em 2008, tocou inteirinho o repertório do clássico segundo álbum em um festival em Nova Iorque, repetindo a dose depois em Londres.

Look at The Rain (‘Huevos’, 1987)
Automatic Mojo (‘Huevos’, 1987)
Attacked By the Monsters (‘Monsters’, 1989)
Strings On Tour Heart (‘Monsters’, 1989)

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

My Life in Lists – discos (2000’s)

RADIOHEAD – In Rainbows (2007)‘Ok Computer’ pode ser o álbum de ruptura, o que entrou pra história – em minha canção favorita deles, ‘Subterranean Homesick Alien’ –, mas o que mais me pegou foi este aqui, em que as vanguardices, o desamparo, o estranhamento, as referências ao krautrock, ao pós-rock e até ao progressivo encaixam-se perfeição, em uma sonoridade enxuta e moderna. É isso: o Radiohead soa contemporâneo/conectado/original sem fazer força. Grandes músicas a escolher: ‘Body Snatchers’, ‘All I Need’ (linda), ‘House Of Cards’, ‘Jigsaw Falling Into Place’. Grande cara esse Thom Yorke, rumando firme para o Olimpo do rock de todos os tempos.

BJÖRK – Vespertine (2001)
Confesso que entre os álbuns de Björk, tenho uma leve predileção por ‘Homogenic’ em relação a este aqui – acontece que aquele não entra na minha lista dos 90 (por pouquinho, é verdade), e este passa por cima da concorrência. Mas ‘Hidden Place’, ‘Coccon’ e ‘Pagan Poetry’ são tão emocionantes quanto ‘Jóga’, e ainda tem ‘An Echo, A Stain’, ‘Aurora’ ... O disco tem a colaboração do duo californiano Matmos, que faz electronica experimental – gravaram um disco recheado de sons colhidos em cirurgias, o curioso ‘A Chance to Cut Is a Chance to Cure’. Mas o que se sobressai é a interpretação da islandesa, plácida como nunca. Mais um discão da ex-cantora dos Sugarcubes (alguém ainda se lembra deles?).

OUTKAST – Stankonia (2000)

Pra mim, o melhor disco de hip-hop dos anos 2000, melhor até do que o excelente disco duplo dos caras que veio na sequência, ‘Spearboxx/The Love Below’ (2003), em que resolveram trabalhar separados. Aqui, o clima é de entrosamento total entre Andre 3000 e Big Boi, e faixas entorpecidas como ‘Gasoline Dreams’, ‘B.O.B.’, ‘So Fresh, So Clean’ são irresistíveis. E tem ainda uma das grandes canções desta década, ‘Ms. Jackson’. Pensei que já não se fizessem discos de rap como este – na verdade, não fizeram mais depois. Nem eles mesmos.

QUEENS OF THE STONE AGE – Rated ‘R’ (2000)
Sério candidato a melhor disco de rock da década. Só ‘Elephant’, dos White Stripes, é capaz de rivalizar com esta paulada classuda. Josh Homme é mestre da guitarra rítmica, desfilando riffs cortantes em canções com refrões marcantes num som potente que desce redondinho como o melhor whisky – ou cerveja, segundo a propagarnda aquela. É aqui que está a canção mais conhecida da banda, o hino hedonista/inconsequente/pé na jaca ‘Feel Good Hit of The Summer’ (‘Nicotine, Valium, Vicodin, Marijuana, Ecstasy and Alcohol’). Recém-relançado numa edição dupla de luxo, que deixou a capa mais bonita (era azul, agora é vermelha), e traz um show inteirinho da época, a apresentação dos caras em Reading, em que não faltam a citada ‘Feel Good ...’, ‘Better Living Through Chemistry’, ‘Monsters in The Parasol’, ‘The Lost Art of Keeping a Secret’. Um discão de rock em que nada falta.

THE WALKMEN – Everyone Whe Pretended to Like Me is Gone (2002)
Vou confessar que a última vez que ouvi este disco já faz alguns anos, mas não é migué: o mix Tom Waits/U2/Nick Cave, além de classudo, é arrebatador. Estes novaiorquinos já haviam formado uma banda bacana antes, o Jonathan Fire-Eater, de curta duração, mas o Walkmen é melhor que o JF-E. Têm disco novo prometido pro mês que vem, ‘Lisbon’ – o mais recente, ‘You & Me’, é de 2007. Curiosidade: construíram o próprio e caprichado estúdio de gravação, no qual até a Nação Zumbi já gravou.

TV ON THE RADIO – Desperate Youth, Blood Thursty Babies (2003)
A banda mais cool da década, em seu registro de estreia – excluindo-se, claro, o E.P. de estreia, ‘Young Liars’ –, ainda soando mais como The Fall e P.I.L. do que Prince, P-Funk e Tälking Heads. Ainda assim, o apelo afropop surge firme aqui e ali, assim como as referências gospel. Tunde Adebimpe é um dos grandes revelações de cantores dos 2000, David Sitek é um mago da produção e ‘Staring at The Sun’ e ‘Dreams’ estão entre as melhores canções da década. Mas ainda tem ‘The Wromg Way’, ‘Ambulance’ ...

LCD SOUND SYSTEM – LCD Sound System (2005)
Rock moderno é isso aqui: electro, house, krautrock, disco, todas as referências certas para quem realmente compreende o que acontece na seara pop/rock. James Murphy é o cara, que ainda por cima, tem um selo quer lança pencas de coisas bacanas, da atualidade e do passado, principalmente daquele fundamental período entre o final dos anos 1970 e o começo dos 1980 – justamente o que mais influenciou seu grupo. Após um terceiro disco já demonstrando sinais de cansaço, diz que vai aposentar o grupo. Sujeito sábio, como se vê.

ANIMAL COLLECTIVE – Meriweather Post Pavillion (2009)
O melhor disco do ano passado, e um dos melhores da década, síntese do caldeirão múlti-referencial que caracteriza a primeira década do século XXI, em especial a música eletrônica: soa um pouco como electropop dos anos 1980, lembra certas vanguardices de Laurie Anderson, não soa deslocado ao lado dos baluartes da electronica dos 90’. Noah Lennox, um dos cabeças, é responsável por um outro projeto extra bacana, o Panda Bear. ‘My Girls’, ‘Lion in the Coma’, ‘Taste’, a maioria das faixas de ‘Merriweather ...’ vicia de cara. Deixou a (forte) concorrência comendo poeira no ano passado.

WHITE STRIPES – Elephant (2003)
De tanto ouvir até encheu, razão pela qual sua inclusão na lista chegou a estar ameaçada, mas pelo simples fato de que viciou direto quando chegou até minhas mãos e a obsessão permaneceu por muito tempo, que não tem como evitá-lo. O segredo de Jack White é ser tão fiel às raízes da música americana, notadamente o blues, quanto fazer seu grupo soar como uma banda indie. ‘Seven Nation Army’ não é menos que clássica, ‘The Hardest Button to Button’, também, ‘In the Cold, Cold Night’ revela a ótima intérprete que Meg pode ser (impossível não lembrar de Moe Tucker), a sensacional cover de ‘I Just Don’t Know What To Do With Myself’ (aula de como se faz versões pra canções alheias), ‘Ball and Biscuit’, ‘Black Math’, ‘Girl, You Have No Faith In Medicine’ ... Um disco de rock como há muito não se fazia – e Jack ainda legaria aos fãs o brilhante álbum de estreia dos Raconteurs e o bacana The Dead Weather.

VAMPIRE WEEKEND – Vampire Weekend (2008)
Se o novo, ‘Contra’, é um tanto polido – ainda que traga grandes canções, como o single ‘Horchata’ –, este é totalmente ‘raw’, roots mesmo. Os auto-apelidados West Side Soweto vieram pra ficar – ‘Mansard Roof’, ‘A-Punk’, ‘Oxford Comma’, ‘I Stand Corrected’ e ‘The Kids Don’t Stand a Chance’ estão aí pra comprovar. Esqueça as origens, digamos, burguesas do grupo. Fazem lembrar os melhores momentos dos Talking Heads – mas sem as vanguardices de David Byrne.

Suplente: 'The Moon & Antactica' (2000), do Modest Mouse, relacionado num post recente, entre os relançamentos mais bacanas de 200.

My Life in Lists – discos (90’s)

BEASTIE BOYS – Check Your Head (1992)
Um dos dois discos fundamentais do trio Ad Roc/Mike D/MCA – o outro é ‘Paul’s Boutique’ (1989) – ‘Check Your Head’ não é um disco apenas de hip-hop: aqui os caras se armam de guitarra, baixo e bateria, e, com o auxílio do percussionista Eric Bobo e do tecladista Mark Ramos Nishita (AKA Money Mark), samples de Jimi Hendrix e referências que vão de Sly Stone ao soul jazz e as trilhas blaxpoitation setentistas, compõem um álbum excitante (originalmente duplo em vinil), inspiradíssimo. Clássicos às pencas: ‘Jimmy James’, ‘So Watcha Want’, ‘Gratittude’, ‘Funky Boss’, ‘Pass The Mic’, ‘Someting’s Gotta Give’ ... O álbum de hip-hop da era grunge.

NIRVANA – Nevermind (1991)
Falar da importância do segundo álbum do Nirvana para a indústria é chover no molhado, típico caso de “antes e depois de”. Não que ‘Nevermind’ tenha causado uma ruptura estética significativa – tudo que está aqui já havia sido trabalhado por ‘n’ bandas antes –, mas ao escancarar as portas das majors e das paradas para o som alternativo, acabou por tornar o negóciod e música pop um pouco mais decente. Sem falar no fato inescapável de ter servido perfeitamente de trilha sonora para a juventude angustiada de seu tempo – outro clichê. Podem ficar brabos, ms é verdade: o Nirvana foi o que ficou do grunge. Os outros são todos secundários. A famigerada ‘Smells Like Spirit’, ‘Breed’, ‘Drain You’, ‘Polly’, ‘Something In The Way’, ‘Come As You Are’, ‘In Bloom’ ... Nada se perdeu. O posterior ‘In Utero’ é tão bom quanto este – mas mais contido, travado, bem no clima junky em que Kurt se meteu e infelizmente não saiu.

CHEMICAL BROTHERS – Dig You Own Hole (1997)
Poucos discos de rock soam tão rock como este segundo álbum dos irmãos químicos, Ed Simmons e Tom Rowland. Uma colagem sensacional de sons lisérgicos, que chega ao absurdo de juntar mais de 300 samples em uma só música (convenientemente batizada ‘Databank’), tem a manha de chamar o pessoal do Mercury Rev (em 'The Private Psychedelic Reel’, veradeira sinfonia psicodélica) e revisitar a beatle ‘Tomorrow Never Knows’ (‘Setting Sun’, cantada por Noel, do Oasis). E ainda tem o baticum viciante de ‘Block Rockin’ Beats’, a bela ‘Where Do I Begin’ (com a voz de Beth Orton), o transe de ‘It Doesn’t Matter’, a paulada funky da faixa-título. Diversão non stop para as massas.

PRODIGY – The Fat of the Land (1997)
Ao lado de ‘Nevermind’ (Nirvana), o álbum punk noventista. Tem muito de Sex Pistols aqui, não só no visual do doidão Keith Flint, mas na levada agressiva de uma pá de faixas: ‘Serial Thrilla’, a cover de ‘Fuel My Fire’ (L7), especialmente ‘Firestarter’ (um hino roqueiro dos 90’s), mesmo ‘Smack My Bitch Up’ e ‘Breathe’. ‘Narayan’ leva o ouvinte às nuvens, ‘Mindfields’ faz pensar que uma bad trip pode não ser tão ruim assim, ‘Diesel Power’ é hip-hop esquizo/chapadão (com rap de um dos heróis de Liam Howlett, Kool Keith) ... Quem não ouviu o disco três, quatro vezes, em mais de uma ocasião, e a excitação só aumentava após cada uma delas? Nunca mais o Prodigy voltou à velha forma, uma pena.

DEPECHE MODE – Violator (1990)
O disco definitivo do Depeche, que serviu para que os antigos detratores, preconceituosos, firmasse novo conceito sobre o grupo. Denso, dark, retrato perfeito das incertezas da virada dos anos 1980 para os 1990, um ‘Achtung Baby’ (ou ‘Zooropa’) mais sofrido. David Gahan prova pela enésima vez que é um baita intérprete – e repetiria o feito várias vezes depois. Ao hit ‘Enjoy the Silence’ (‘Words like violence/Break my silence/Come Crashing In/Into My Little World’) somam-se composições inspiradas como ‘The World in My Eyes’, ‘Halo’ (minha preferida), ‘Personal Jesus’ (gravada depois por ninguém menos que o men in black em pessoa, Johnny Cash), ‘Policy of Truth’, ‘Clean’. O Depeche é um caso sério, não dá pra querer negar.

MASSIVE ATTACK – Mezzannine (1998)
O álbum mais sombrio do então trio de Bristol, e que trouxe os caras ao Brasil: a turnê de divulgação de ‘Mezzaninne’ inclui datas no falecido Free Jazz Festival, e Porto Alegre viu o show, excelente, no Teatro do Sesi. Se o primeiro disco é um clássico absoluto dos anos 1990 – ‘Blue Lines’ lançou as bases do triphop –, e o segundo, e o luxuoso ‘Protection’ segurou a onda, este é o disco mais roqueiro do grupo – a ponto de causar discordâncias internas sérias. A matadora sequência de abertura – a pesadona ‘Angel’ (regravada pelo Sepultura), a sinistra ‘Risingson’, o hit ‘Teardrop’ (com a brilhante participação da fada dos cocteau Twins, Liz Fraser), a orientalizada ‘Inertia Creeps’ – é inigualável, mas ‘Man Next Door’, com Horace Andy mais uma vez arrasador e sample muito bem sacado de ‘10:15 Saturday Night’, do Cure, ‘Dissolved Girl’ e a faixa-título não ficam muito atrás. Só este ano é que o Massive Attack foi entregar aos fãs um álbum digno de sua gloriosa trinca inicial – mas ainda assim ‘Heligoland’ não resiste à comparação com ‘Mezzaninne’.

PJ HARVEY – Dry (1993)
O feroz álbum de estreia de Polly Jean tornou-se um dos preferidos de Kurt Cobain, logo que lançado. Não é difícil entender por que: boas melodias, influência sutil porém marcante do blues, letras iradas. ‘Sheila NA Gig’ e ‘Dress’ são os hits, mas tem ainda o lamento de ‘Oh My Lover’, ‘Happy and Bleeding’ (sobre mesntruação!), a acachapante ‘Water’ (minha preferida) ... O início de uma trajetória brilhante.

MERCURY REV – Desserter’s Songs (1998)
Este disco marca uma guinada significativa do grupo americano: um álbum pastoral, de tinturas folk, depois dos ultra-barulhentos trabalhos iniciais – chegaram a ser expulsos do palco de um show no Festival Lollapalooza, em meados dos anos 1990, porque as autoridades de uma localidade do interior dos Estados Unidos, atendendo reclamações da vizinhança, constataram que o MR tocava em um nível de decibéis muito acima do permitido. ‘Desserter’s ...’ abre com a floydiana ‘Holes’, tem ainda a linda ‘Tonite It Shows’, a arrepiante ‘Endlessly’ (e seu som de serrote), a bacana ‘Goddess On a Hiway’, as sinfônicas ‘Opus 40’ e ‘Hudson Line’. A participação dos The Band Garth Hudson e Levon Helm é um achado. O disco psicodélico/onírico da década.

SONIC YOUTH – Goo (1990)
Certo que não é o melhor disco de Thurton, Kim, Lee e Steve, mas aqui o caráter sentimental fala (muito) mais alto: foi o álbum que mais ouvi em uma época muito especial, meu exílio norte-americano (e só fui ver os caras ao vivo 5 anos depois, em San Francisco, e depois de novo em São Paulo, em 2000). O primeiro álbum do SY por uma major traz canções com claro teor pop mas a velha pegada punk/experimental que fez a fama do grupo na trinca clássica que o antecede (‘EVOL’/‘Sister’/‘Daydream Nation’). Os petardos vão se sucedendo: ‘Dirty Boots’, ‘Tunic (Song For Karen)’ (sobre Karen Carpenter, uma das obsessões do quarteto), a feminista ‘Kool Thing’ (com participação engraçada de de Chuck D), ‘Mote’ (cantada por Lee), ‘My Friend Goo’, ‘Disappearer’, a instrumental ‘Mildred Pierce’, ‘Cinderella’s Big Score’. Quem falou que este álbum não está altura dos clássicos do grupo?

PAVEMENT – Crooked Rain, Crooked Rain (1995)

A última bolachinha a ser incluída na lista, ganhando no tapa de ‘Angel Dust’ (Faith No More, 1992) e ‘Chocolate and Cheese’ (1994, Ween). A melhor guitar band dos anos 1990 (quen me perdoem os fãs dos Pixies), e o álbum mais equilibrado, tão espontâneo quando o debut, ‘Slanted and Enchanted’, mas sem a tosqueira, e já incluindo as referências ao rock e ao pop clássicos que dominariam sua produção nos discos finais. Um disco que tem composições como ‘Range Life’, ‘Gold Soundz’, ‘Cut Your Hair’, ‘Elevate Me Later’ e ‘Stop Breathin’ não tem nada faltando.

My Life in Lists – discos (80’s)

RUN DMC – Raising Hell (1986)
Toda uma geração descobriu o rap aqui, e há uma explicação mais do que óbvia: a cover de ‘Walk This Way’, com participação do Aerosmith, autores da canção, inclusive no clipe bem sacado em que a parede é quebrada, resultando no crossover definitivo entre o rock branco e a música black. Mas ‘Raising Hell’ é muito mais que ‘Walk ...’: ‘Peter Piper’, com seu canto de chamada e resposta e levada econômica (uma das marcas da excelente produção do barbudão Rick Rubin) abre os trabalhos, e a elas seguem-se outros clássicos como ‘It’s Tricky’, ‘My Adidas’, ‘Perfection’ (onde o minimalismo chega ao extremo, é praticamente só voz e bateria) ‘You Be Illin´’, as guitarras serra elétrica de ‘Raising Hell’, ‘Dumb Girl’. Pra se ouvir como se ouve um disco de rock – que é o que ele é, na essência.

PUBLIC ENEMY – It Takes a Nation of Millions to Hold Us Back (1988)
A prova definitiva de que letras de cunho social (até radicais) e postura anti-establishment não são demodé – desde que trabalhadas com talento e honestidade. O mais furioso hip-hop gravado até então, neste segundo disco de Chuck D, Flavor Flav e cia. não perdeu nada nesses 22 anos. ‘Black Steel In The Hour of Chaos’, depois regravada pelo Sepultura, ‘Bring The Noise’, uma das primeiras a utilizar a batida de ‘Funky Drummer’, de James Brown (e que viraria moeda corrente logo, logo), mais tarde regravada pela própria banda em parceria com o Anthrax, e ‘Don’t Believe The Hype’ são os clássicos óbvios, mas tem ainda a cacetada de ‘She Watch The Channel Zero?!’ (com o riff de ‘Angel of Death’, do Slayer, sampleado), ‘Show’Em Watcha Got’, ‘Rebel Without a Pause’ (bela auto-definição) e a resposta ao hedonismo dos Beastie Boys e sua ‘(You Gotta) Fight For Your Right (To Party!)’, em ‘Party For Your Right to Fight’. Sério candidato a melhor disco de hip-hop de todos os tempos, e vale aqui até mais o escrito no texto anterior, sobre o Run DMC: é rock, mais do que todo o rock gravado naquela década e desde então.

PREFAB SPROUT – Steve McQueen (1985)
Esqueça o Simply Red e seu pop soul pretensioso e xarope: o PS fez um dos mais bonitos discos do pop oitentista mixando influências que vão de Marvin Gaye (de quem o cantor e compositor Paddy McAllon sempre foi fã confesso) à country music americana, do soft rock à new wave. Mas o trunfo dos caras eram mesmo as letras inspiradíssimas de Paddy, um dos músicoa que melhor compôs sobre relacionamento nas últimas duas décadas e meia: ‘Bonny’, ‘Faron young’, ‘Apettite’, ‘Horsin´ Around’ ... é uma melhor que a outra. Mas o tiro de misericórdia é mesmo ‘When Love Breaks Down’, capaz de enternecer o mais duro e frio coração. ‘Steve McQueen’ saiu aqui com o título americano, ‘Two Wheels Good’, por complicações com os herdeiros do mítico ator americano, falecido cinco anos antes do álbum. Formado em Newcastle em 1977, o Prefab ainda está na ativa, mesmo com os sérios problemas de visão enfrentados por Paddy.

THE SMITHS – Hatful of Hollow (1984)
Os álbuns clássicos dos Smiths certamente são ‘The Queen is Dead’ (1986) e o primeiro, homônimo, mas a compilação ‘Hatful of Hollow’ tem uma peculiaridade que a faz um registro tão antológico quanto os melhores álbuns de carreira do grupo: traz Morrisey, Marr, Rourke e Joyce tocando ao vivo nos estúdios da BBC em plena forma, arrebatamento e soando absurdamente concisos. Isso sem falar na inclusão de clássicos lançados só em single, faixas maravilhosas que não se encontra em nenhum dos álbuns de carreira da banda. ‘William, It Was Really Nothing’, ‘What Difference Doe It Make?, ‘How Soon is Now?’ (I’m the Son and heir of a shyness that is ciminally vulgar/I’m the son and heir of nothing in particular’), ‘Hand In Glove’, ‘Please, Please, Please, Let Me Get What I Want’, ‘Still Ill’, ‘Handsome Devil’ ... São ao todo 16 faixas sensacionais.

COMSAT ANGELS – Waiting for a Miracle (1980)

Pouco falada, menos ainda ouvida, essa banda inglesa de Sheffield fazia uma música tão densa, desesperançada e gelada que o Joy Divison, e até algumas similaridades podem ser notadas no som: bateria trubal, com farto uso de tom-tons, guitarras esparsas, baixo pulsante. Pensou na Legião Urbana e demais bandas brasilienses dos anos 1980? Sim, chuparam tudo daqui, e como ninguém conhecia o som do CA mesmo, Renato Russo (embora fosse cínico o suficiente pra citar o grupo como uma das grandes influências da Legião) e demais piratas jamais sofreram a execração pública que mereciam – ouvir ‘Independence Day’ chega a dar nojo dos brasilienses. A esquizofrênica ‘Missing In Action’ abre o disco, que tem grandes momentos ainda na faixa-título, em ‘Total War’, ‘Postcard’ ... As versões expandidas trazem bônus bacanas, como ‘Ju Ju Money’ e ‘Home Is The Range’. Pérola infelizmente escondida do brilhante pós-punk britânico.

TOM WAITS – Rain Dogs (1985)
Sério candidato a melhor disco de bebum de todos os tempos – concorrendo, provavelmente, com outras obras de Tom. R’n’b, vaudevile, jazz, polka ... um verdadeiro caldeirão de referências múltiplas e díspares de onde sai um amálgama incrivelmente coerente, tudo se encaixa à perfeição. Grandes canções, como ‘Clap Hands’, ‘Cemetery Polka’, ‘Jack Full Of Bourbon’, ‘Time’, a manjada ‘Downtown Train’, a belíssima ‘Anywhere I Lay My Head’ (que recebeu versão honesta da bela Scarlett Johansson, mas é naturalmente arquivada com a cruel comparação) ... É bem o disco que, depois que pega (pode demorar um pouco), não te larga mais. Décimo álbum de Waits, que vinha de outras duas obras-primas – a trilha de ‘One From The Heart’ (‘O Fundo do Coração’, de Coppola, 1982) e ‘Swordfishtrombones’, de 1983 –, e lançaria outras mais nos 25 anos seguintes.

BRUCE SPRINGSTEEN – Nebraska (1982)
Outro disco que pode levar um tempo pra ser descoberto. Primeiro porque, embora frequentemente seja citado em textos sobre a carreira do Chefão, não gerou nenhum hit – só ‘Atlantic City’ teve execução razoável, nas rádios americanas e na MTV. ‘Nebraska’, cujo retrato do cidadão comum americano, suas mazelas, percalços, esperanças, angústias, inspirou até filme de Sean Penn (‘The Pledge’, com Jack Nicheolson), é precursor da onda lo-fi que tomou conta do rock indie americano na primeira metade dos anos 1990: foi inteirinho gravado de forma caseira, com Bruce, seu violão e sua gaita, utilizando um modesto gravadorzinho. Trata-se do disco mais corajoso gravado por Sprinsteen em toda sua vitoriosa carreira: o cara já era um megastar e o álbum, que á basicamente uma coleção de demos, saiu por uma grande gravadora. A faixa-título, a citada ‘Atlantic City’, ‘Mansion On The Hill’ e ‘Reason to Believe’ são alguns dos highlights.

HÜSKER DÜ – Zen Arcade (1984)
Álbum importantíssimo, originalmente duplo em vinil, um dos melhores do excelente catálogo da SST Records de Greg Ginn, que lançou clássicos dos Meat Puppets, Bad Brains, o melhor Dinosaur Jr. (‘You’re Living All Over Me’, suplente desta lista), Minutemen, Sonic Youth. O hardcore peculiar do trio Grant Hart/Bob Mould/Greg Norton recebe a partir de ‘Zen ...’ referências da psicodelia, do country rock, do folk, e o contraste delicadeza/aspereza, barulho/melodia é desenvolvido à perfeição. ‘Something I Learned Today’ começa o serviço quebrando tudo, e as outras 22 faixas não deixam a peteca cair. Alguns destaques: ‘Turn On The News’, ‘Masochism World’, ‘Never Talking to You Again’, ‘Pink Turns to Blue’. Um dos discos de rock que marcaram os anos 1980.

JESUS AND MARY CHAIN – Psychocandy (1985)
Lembro até hoje da audição de ‘Psychocandy’, em um toca-discos colocado à disposição da freguesia, em uma famosa loja da Galeria Chaves, centro de POA, tradicional ponto de encontro de rock/pop maníacos em meados dos 80’s – a Pop Som. Já tinha lido sobre o Jesus na revista Bizz e me interessei pelo mix melodias pop assobiáveis/paredão de microfonia. Além do quê, a referência frequente que se fazia quando se falava nos irmãos Reid era ao Velvet Underground, cuja história me interessava – mas também não conhecia, ainda. Bom, mas quando acomodei a agulha na bolacha e ‘Just Like Honey’ começou a rodar, logo me senti em transe. Balada cool, sentida, o tal pop perfeito do qual a crítica inglesa fala, só que emoldurado por uma (até aí leve) camada de distorção. Vem a seguinte, ‘The Living End’, depois ‘Taste The Floor’, ‘The Hardest Walk’ ... o Lado A fecha com um pop bumblegum com guitarra serra elétrica do c*. Viro e coloco o lado B, que começa com a matadora ‘Never Understand’ (cuja linha melódica foi plagiada desavergonhadamente pela Legião Urbana em “Eu Era Um Lobisomem Juvenil’, que também rouba sem a menor sutileza o título de um clássico dos Cramps), depois vem ‘Inside Me’, mais adiante tem ‘You Trip Me Up’, e tudo fecha espetacularmente com ‘Its So Hard’. Alucinado/eletrizado/sob frenesi total, decidi levar o disco, mesmo achando que a audição provavelmente tenha sido prejudicada pelo mau estado da cópia colocada para audição, que devia estar arranhada. Cheguei em casa, abri o pacote e tirei um vinil estalando de novo pra tocar, e constatei imediatamente que a cópia ouvida meia hora antes não estava arranhada. O arrebatamento só tava começando. Foi, sem sombra de dúvida, o maior choque musical da minha vida depois da primeira audição dos Pistols – que definiram tudo. Vi o Jesus ao vivo há 20 anos – sim, esse tipo de banda tocava nos palcos de Porto Alegre tempos atrás –, no Salão de Atos da UFRGS, e o zunido no ouvido permaneceu por uns três dias. Unbelievable. Mas voltando ao do disco, tem uma versão alemã disponível que adiciona ainda a maravilhosa ‘Some Candy Talking’, single de 1986, último com a formação original, com Bobby ‘Primal Scream’ Gillespie e Douglas Hart secundando os Reid Brothers. Te liga: ‘Psychocandy’ vai tocar inteirinho, na ordem, naquele esquema Lado A/Lado B, no COMPANHIA MAGNÉTICA quando do aniversário de 25 anos de seu lançamento. Em breve, muito breve.

MARIANNE FAITHFULL – Strange Weather (1987)
O melhor disco de fossa das últimas duas décadas e meia, provavelmente. Clima de cabaré total. Marianne volta com um álbum lindo e sofrido, depois de anos e anos relegada ao limbo. O espírito de Tom Waits paira aqui – é dele a faixa-título – mas aqui o humor waitsiano cede lugar apenas à dor. Grandes músicos, como Fernando Saunders, Dr. John, Bill Frisel, Robert Quine, produção luxuosa, clássicos do cancioneiro de todos os tempos, como ‘Boulevard of Broken Dreams’, ‘Yesterdays’, ‘Penthouse Serenade’, o bluesão ‘I Ain’t Go Down to The Well No More’, de Leadbelly, a dylaniana ‘I’ll Keep It With Mine’ (composta para Edie Sedwick, gravada por Nico), a sexy ‘Hello Stranger’, de Doc Pomus ... Sabe aquele papo de “decadência com elegância”? É bem isto aqui. A versão de ‘As Tears Go By’, composta pra ela mesma por seu então namorado Mick Jagger, rivaliza com o original dos Stones – pura questão de gosto pessoal.

O ano até aqui (IV)

Alguns dos melhores relançamentos de 2010 até o final da primeira quinzena de agosto:

SERGE GAINSBOURG & JANE BIRKIN – ‘Serge Gainbourg et Jane Birkin’ (1969)
Clássico da sacanagem chic de um eterno provocador e sua então musa, a atriz inglesa, futura mamãe da descolada Charlotte. É deste disco a música mais conhecida do figuraça Serge, ‘Je T’Aime Moi Non Plus’, tema do filme dirigido por ele mesmo – lançado este ano no Brasil em DVD pela Lume –, ‘Paixão Selvagem’, que traz o antigo dançarino da troupe de Andy Warhol, Joe D’Alessandro, como um caminhoneiro gay que desenvolve uma obsessão apaixona por uma garota (Jane) de cabelos curtíssimos e aparência quase infantil – daí que ele a sodomiza o tempo todo, fantasiando que está se relacionando com um garoto. Gainsbourg é único.

QUEENS OF THE STONE AGE – ‘Rated R’ (2000)
Melhor disco da banda, ganhou agora a tradicional edição DeLuxe – disco duplo, com uma cacetada de faixas bônus. No caso, um show inteirinho de Josh Homme e comparsas à época. ‘R’ é o disco mais equilibrado e conciso do QOTSA, com riffs ganchudos, barulheira na medida, experimentalismos sutis. É deste disco o hino ‘Feel Good Hit of the Summer’ (aquela canção que desfila o nome de uma série de drogas), mas tem ainda ‘Monsters In the Parasol’, ‘The Lost Art of Keeping a Secret’, ‘Auto Pilot’, ‘Parasol’, ‘Better Living Through Chemistry’ ... Stoner Rock do melhor. O disquinho adicional traz todos os lados B dos singles, além doarrasador show dos caras no Festival de Reading do ano. A edição especial, comemorativa aos 10 anos de lançamento, melhorou o que já era excelente, e até a capa ficou mais atraente: saem o azul (que compunha com preto e branco a combinação mais horrorosa que se conhece) e entra o vermelho. O super power trio arregimentado com pompa e circunstância por Josh no ano passado – o Them Crooked Vultures, com Dave Grohl e John Paul Jones – não chega nem perto disso aqui.

R.E.M. – ‘Fables of Reconstruction’ (1985)
Terceiro disco da banda de Michael Stipe, aquele famoso álbum de transição – no caso, de uma banda que tinha causado sensação com seus dois primeiros álbuns e o E.P. de estreia com um energético college rock de tintas rurais. ‘Fables of Reconstruction’ (ou ‘Reconstruction of Fables’, dá no mesmo) claramente procura novos caminhos, com o auxílio de metais, arranjos de cordas e um certo estranhamento. Curiosidade: foi o primeiro a sair no Brasil, em vinil, por uma tal ‘New Rock Collection’ (com as famosas tarjinhas amarelas ornamentando as capas), que também lançou Prefab Sprout, Lone Justice, Big Audio Dynamite. Longe de ser o melhor, é, por outro lado, um dos discos mais curiosos do R.E.M. Tem os hits ‘Can’t Get There From Here’ e ‘Driver 8’, e a estranhona ‘Feeling Gravity’s Pull’, que abre o disco, além das bacanas ‘Maps and Legends’, ‘Life and How to Live It’, ‘Auctioneer’, ‘Old Man Kensey’, ‘Green Grow the Rushes’.

JUNIOR MURVIN – ‘Police & Thieves’ (1977)

Clássico do reggae do cantor de jamaicano de Port Antonio de timbre peculiar, cuja faixa-título é mais conhecida por aqui na versão do Clash – que, usando o mesmo produtor (o bruxo do dub, Lee ‘Scratch’ Perry), registrou-a no mesmo ano, em seu álbum de estreia. Mas a obra não resume-se à evidentemente marcante faixa-título: ‘Roots Train’, ‘Solomon’, ‘Lucifer’, ‘I Was Appointed’ e outras pérolas do groove garantem a paz espiritual do ouvinte.

CURE – ‘Disintegration’ (1989)
O último grande disco do Cure – e lá se vão mais de 20 anos. Melancólico e pop, ‘Disintegration’, disco de cabeceira de uma geração de músicos americanos e ingleses, soa quase que como um mix do pop de ‘Head On The Door’ e o pesadelo de ‘Pornography’. Pop sombrio pra tocar no rádio, como só Bob Smith e cia. sabiam fazer: anos depois, Robert Smith reuniu o repertório do pesadão ‘Pornography’ (1982), o deste e o de ‘Bloodflowers’ (2000) numa série de shows em Berlim, ‘Trilogy’ (espécie de trilogia gótica). A presente edição especial é mais do que luxuosa: virou um álbum triplo, em que às canções originais (clássicos como ‘Pictures of You’, ‘Love Song’, ‘Lullaby’ e ‘Fascination Street’), remasterizadas, juntam-se e um disco só com demos, ensaios e versões alternativas das músicas registradas e ainda, créme de la créme, show inteirinho da época, realizado em julho de 1989 no velho Wembley, com todas as canções tocadas na mesma ordem do álbum. Vale a pena se endividar por esse brinquedinho aqui.

PAVEMENT – Quarentine The Past (2010)
Não é propriamente um relançamento, uma vez que as canções estão aqui agrupadas desta maneira pela primeira vez, mas trata-se da coletânea definitiva da banda, que desde o ano passado voltou a se apresentado no hemisfério norte – mas já avisou que não vai retomar a carreira nem lançar música nova. O que faz de ‘Quarentine’ ainda mais essencial: o Pavement é a quintessência da guitar band indie da primeira metade dos anos 1990, com senso de humor (às vezes até maldoso, como em ‘Range Life’), dissonância e aquele estilo chapado/largadão bem próprio da época. Alguns clássicos ficaram de fora, o que seria inevitável, mas o acerto na escolha foi justamente privilegiar raridades difíceis de encontrar, pois foram lançadas só em singles e outras coletâneas – mas de qualquer maneira ‘Summer Babe’, ‘Gold Soundz’, ‘Stereo’, ‘Shady Lane’, ‘Here’, ‘Trigger Cut/Wounded-Kite At :17’ estão aqui, reluzentes. É bala.

THE FLESHTONES – ‘It’s Super Rock Time! The I.R.S. Years – 1980-1985’ (2010)
Outra coletânea caprichada, de uma banda veterana – a origem remonta ao Queens novaiorquino no ano de 1976 –, focando seu período clássico, a primeira metade dos anos 1980, em que eram uma das principais estrelas do selo I.R.S., que fez fama por revelar o R.E.M. O protopunk regado a muito r’n’b clássico dos Fleshtones, liderados pelo carismático Peter Zaremba (ex-apresentador da MTV americana), pegam na veia, em faixas como ‘I’ve Got to Change My Life’, ‘R-I-G-H-T-S’, ‘Roman Gods’ e ‘American Beat’ – essa última incluída na trilha da comédia teen “Despedida de Solteiro”, em 1984. Abriam tanto os shows do Blondie e dos Ramones, quanto de Chuck Berry e de James Brown.

THE UNITS – 'The Early Years: 1977-1983' (2007)

A compilação foi originalmente lançada há três anos, coincidindo com os 20 anos das primeiras gravações, mas tá sendo reposta agora no mercado gringo. Os californianos Units froma uma das primeiras bandas de ‘synthpunk’ da história, surgida poucos anos depois do Suicide em San Francisco – mas os sintetizadores dos caras soavam como guitarras distorcidas em faixas como ‘High Pressure Days’. Seus shows eram lendários, com direito a projeção de filmes anti-stablishment feitos por eles próprios.

IGGY & THE STOOGES – 'Raw Power' (1973)
É provável que este terceiro disco do Iguana e seus comparsas não seja o melhor do grupo – o segundo, ‘Fun House’, que acaba de completar 40 anos de lançamento, . Mas também não faz muita diferença: ‘Raw Power’ é tão essencial tanto. Mais alucinado, mais barulhento, é uma catarse sem precedentes no rock, uma cacetada que nem Iggy nem ninguém conseguiu repetir. Um crítico brasileiro, certa vez, resenhando o (bom) ‘Instinct’, torcendo o nariz para a bolabcha gravada por Iggy em 1987, forçou a comparação: “tente marcar as músicas batendo o pé em ‘Raw Power’ ... Impossível”. Melhor definição jamais ouvi. Rock’n’Roll mais animal também não: ‘Search and Destroy’, ‘Your Pretty Face is Going to Hell’, ‘Penetration’, ‘Raw Power’, ‘I Need Somebody’ ... tem até uma baladinha mais ou menos delicada – mas não muito, saca o título: ‘Gimme Danger’. A nova Legacy Edition acrescenta várias bônus (muitas das quais os fãs tão carecas de conhecer) e a mixagem original do produtor e salcvador da pátria, David Bowie. Quem não conhece, vai pirar. Quem já conhece ... jamais se recuperou. Me dá mais! Me dá mais!

MODEST MOUSE – The Moon & Antarctica (2000)
Mais uma edição comemorativa – no caso, de dez anos de lançamento do primeiro disco por uma grande gravadora de uma das principais bandas alternativas americanas dos últimos quinze anos. Se toda transição para uma major de um respeitado grupo indie fosse assim ... O esquisitão Isaac Brock e seus escudeiros entregam um álbum mais polido, menos áspero que o clássico ‘Lonesome Crowded West’, mas a densidade e o estranhamento são os mesmos. ‘Dark Center of the Universe’ sempre foi minha preferida, mas tem ‘Gravity Rides Everything’, ‘3rd Planet’, ‘Tiny Cities Made of Ashes’, ‘Paper Thin Walls’, ‘I Came As a Rat’ ... O Modest Mouse depois partiu para um som mais suingado, aparentado dos Talking Heads, e chegou a ter o lendário Johhny Marr, ex-guitarrista dos Smiths, em sua formação. Um novo álbum não deve estar longe.

WILLIE COLÓN & RUBÉN BLADES – 'Siembra' (1978)
Tem preconceito com a latinidad? Bota esse pra tocar, então. Começa com um chacundum que é pura disco music, em ‘Plástico’, depois cai na mais arrebatada salsa. O politizado Bladés está aqui no auge da forma, criticando a sociedade de consumo norte-americana na citada ‘Plástico’, descrevendo o modo de vida terceiro-mundista em ‘Pedro Navaja’ ... A dupla Colón (novaiorquino do Bronx) e Blades (apelidado de “o Bruce Springsteen panamenho”), que teve longa colaboração, quebraria os pratos tempos depois, mas só por esse estupendo álbum, ponto alto do som latino dos anos 1970, já se justificaria.

ROLLING STONES – ‘Exile On Main St.’ (1972)
Fechando a lista, aquele disco de rock/múcia pop com o qual nada que foi ou venha a ser lançado ou relançado neste ano e nos próximos 50 possa ser comparado – até porque os Beatles já passaram por seus “Remaster’, assim como Jimi Hendrix, Bob Dylan e o Velvet Underground. A história das gravações e o conturbado período por que passavam os Stones – fuga do implacável e cruel fisco britânico, os problemas com a lei, o romance sério de Keith, Anita Pallenberg e a heroína ... tudo isso tá contado no livro ‘Uma Temporada no Inferno com os Rolling Stones’, de Robert Greenfield (saiu pela Zahar Editor em 2008), e no documentário ‘Stones In Exile’, que chega ao mercado paralelamente ao disco. Mas ‘Exile ...’, um dos poucos álbuns duplos da história do rock que não traz um mísero instante supérfluo, é uma experiência que tem de ser sentida, não pode ser descrita. Bom, ajuda dizer que ‘Tumbling Dice’, ‘Loving Cup’, ‘Happy’ (uma das melhores canções defendidas por Keith em toda a discografia do grupo), ‘All Down The Line’, ‘Rocks Off’, ‘Shine a Light’, as esquisitonas ‘I Just Wanna See His Face’ e ‘Ventilator Blues’ estão aqui, ao lado de outras 10 pérolas – agora remasterizadas no capricho (o som denso e sujo do grupo então era uma armadilha e tanto, plenamente desviada nesta edição Deluxe) que ganhou a companhia de um disquinho a mais só de bônus da época (mais 10 faixinhas). Sempre achei que meu preferido era ‘Let It Bleed’, agora já não sei mais. O certo mesmo é que os Stones, mesmo recheando sua trajetória de canções clássicas nos últimos 38 anos, jamais conseguiram lançar um álbum tão perfeito, supimpa como este aqui. Nem eles, nem ninguém.

PS – conferir também álbuns antigos de Jon Spencer Blues Explosion e St. Etienne que voltam ao mercado.

O ano até aqui (III)

Alguns singles:

Horchata (Vampire Weekend)
Afropop descolado, bacana, dos auto-apelidados ‘West Side Soweto’ guys. Mais limpinho que os sons do álbum de estreia, mas bem feito e íntegro.

Tighten Up (The Black Keys)
O blues rock indie da dupla Dan Auerbach/Pat Carney agora mais chegado à Motown. Pra tocar no rádio – e isso não é ruim.

Month of May (Arcade Fire)
Uma das faixas que puxam o novo álbum da banda canadense, ‘The Suburbs’, primeiro lugar na parada da Billboard já na semana de lançamento. Rock inteligente, classudo.

Heaven and Earth (Blitzen Trapper)
Belíssima balada do álbum novo do grupo americano de Portland, Oregon, ‘Destroyer of the Void’

Forever & Ever Amen (The Drums)
Tão pegajosa quanto as canções do álbum do Phoenix do ano passado, tem um quê de anos 1950.

The Overachievers (Liars)
Rock experimental, paga tributo tanto ao Can quanto ao Nirvana.

Art Czars (Japandroids)
Mais uma bacana dos canadenses esporrentos, que lançaram o álbum cacetada de 2009, ‘Post Nothing’.

Post Acid (Wavves)
Punk pop chapadão do largado Nathan Williams, que sabe o que faz.

Slow Motion (Panda Bear)
Esta, na verdade, é o lado B. O A é ‘Tomboy’, também muito bacana. Mas o B é melhor. Noah Lennox hoje é o cara.

Written In Reverse (Spoon)
Levada stoneana, mudança de tempo, manha de quem sabe. Os texanos acertam de novo: ‘Transference’ é um dos discos de rock do ano.

Mas o campeão do ano até agora, sem dúvida, é ...

Free (M.I.A.)
Brutal, utilizando como base a matadora ‘Ghost Rider’, do Suicide, e turbinada por versos como ‘’. Grande Maya Arulpragasam! Isso sim é que é rock dos anos 2000.

O ano até aqui (II)

Entre os veteranos, dois se destacam.

Gil Scott-Heron, americano de Chicago, 61 anos completados em abril, vem cumprindo trajetória errática nos últimos tempos: entra e sai da cadeia com enorme facilidade, sempre por problemas com drogas – e violação da condicional. Não gravava um disco desde 1994, quando lançou ‘Spirits’ e o ao vivo ‘Minister of Information’. O excelente ‘I’m New Here’ tem 15 faixas, entre canções e vinhetas, sendo doze compostas pelo cantor – um dos virtuais inventores do rap lá no final dos anos 1960/início dos 1970 recitava seus versos com acompanhamento eminentemente soul-jazzístico –, e tem produção de Richard Russell, cabeça do selo britânico XL Recordings (Basement Jaxx, Devendra, M.I.A., Vampire Weekend, Dizzee Rascal). Tem batidas de hip-hop, samples e efeitos sonoros, mas também violão folk. O clima é autobiográfico (‘On Coming From a Broken Home’, ‘The Crutch’), entre o nostálgico e o reflexivo. A faixa-título é de Bill Callahan, ex-(Smog), herói de CM, e entre as recriações de obras alheias está ‘Me and the Devil’, de Robert Joehnson, e ‘I’ll Take Care Of You’, do repertório de Bobby ‘Blue’ Bland. ‘I’m New Here’ é o disco mais bonito de 2010 até aqui.

Paul Weller, inglês, nove anos menos que Heron – nasceu em Woking, Surrey, em maio de 1958 –, lançou o disco de rock dos primeiros sete meses do corrente. ‘Wake Up The Nation’ é um disco moderno porque não tenta bancar o moderno: profundamente imerso na tradição do melhor rock britânico (as referências de Weller de sempre, Who, Small Faces, os Kinks e os Beatles – tanto a fase psicodélica como o período final, de canções como ‘Don’t Let Me Down’ e discos como ‘Abbey Road’ e o álbum branco), atesta toda a maestria e a maturidade do compositor Weller, em 16 faixas, a maioria curtas, como a faixa-título, ‘Fast Car/Slow Traffic’, ‘No Tears to Cry’, a lisérgica ‘Andromeda’, ‘7 & 3 Is The Strikers Name’ e ‘Trees’ – a mais longa do álbum, com meros 4 minutos e 19 segundos. A carreira solo de Weller é das mais vivas entre seus contemporâneos: ‘Wake Up ...’ é seu décimo álbum de carreira – descontados os registros ao vivo – desde 1992, quando recuperou o a reputação perdida nos tempos de Style Council (que não era tão xarope assim, não sejamos tão cri-cri), lançando o álbum que leva apenas seu nome. A esse, seguiram-se outros grandes álbuns, como o clássico ‘Wild Wood’ (1994), ‘Stanley Road’ (seu álbum que mais vendeu, puxado pela ótima ‘The Changingman’, 1995), ‘Heliocentric’ (2000), ‘Ilumination’ (2002) e o recente ‘22 Dreams’ (2008). Weller é um dos caras que definiu o moderno som britânico, a partir da mais inglesa de todas as bandas a emergir do levante punk da segunda metade dos anos 1970, o Jam. Que o digam os irmãos Gallagher, o Ocean Colour Scene, o Blur, o Supergrass e todo o pessoal do brit-pop. Também gerou cópias desavergonhadas worlwide – conheces um tal de Ira?

O ano até aqui (I)

Bons lançamentos no ano de 2010 abundam: Beach House (‘Teen Dream’ é tão bom ou melhor que ‘Devotion’), Local Natives (ótima guitar band), Vampire Weekend (mais polido que o álbum de estreia, mas com excelentes canções), Surfer Blood (surf music indie, do c*), Spoon (um dos melhores disco de rock do ano), Liars (anarquia é seu nome), boas promessas (Morning Benders, The Radio Dept., Blitzen Trapper, The Tallest Man On Earth), som de raiz (Band of Horses), veteranos da electronica em plena forma (Bomb The Bass, UNKLE), novas feras (Gonjasufi, Flying Lotus), confirmações (Panda Bear e seu novo single, o Black Keys, mais pop mas sem perder o fio).

Tá ameaçando ser até melhor que o ótimo ano de 2009.

Versinhos bacanas (26) – On Coming From a Broken Home (GIL SCOTT-HERON)

“I want to make this a special tribute
To a family that contradicts the concepts
Heard the rules but wouldn'€™t accept
And women-folk raised me
And I was full grown before I knew
I came from a broken home

Sent to live with my grandma down south
When my uncles was leaving
And my grandfather had just left for heaven
They said and as every-ologist would certainly note
I had no strong male figure right?
But lily Scott was absolutely not your mail order
Room service type cast black grandmother
I was moved in with her; temporarily, just until things were patched,
Til this was patched and til that was patched
Until I became at 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 and 10
The patch that held lily Scott who held me and like them 4
I become one more and I loved her
From the absolute marrow of my bones
And we was holdin on,
I come from a broken home
She had more then the 5 senses
She knew more then books could teach
And raised everyone she touched just a little bit higher
And all around her there was a natural sense
As though she sensed what the stars say what the birds say
What the wind and the clouds say
A sensual soul and self that African sense
And she raised me like she raised 4 of her own
And I was hurt and scared and shocked
When lily Scott left suddenly one night
And they sent a limousine from heaven to take her to god,
If there is one.
So I knew she had gone; and
I came from a broken home


(Uma das canções de teor autobiográfico do reflexivo ‘I’m New Here’, excelente disco que põe fim a um hiato de mais de 15 anos na carreira do grande Gil Scott-Heron, ‘On Coming From a Broken Home’ relata uma das passagens mais marcantes de sua vida: a mudança para a casa da avó, Lillie, após o divórcio dos pais. Além de ser um dos inventores do canto falado na música negra americana e um dos primeiros artistas black engajados – as duas facetas podem ser conferidas na canção ‘The Revolution Will Not Be Televised’, de 1970 –, Gil também é escritor: seu romance ‘Abutre’, retrato contundente da vida no gueto, saiu no Brasil anos atrás, publicado pela Ed. Conrad.)

Eu e Meu Brinquedo (11) – BRIAN DE PALMA

Estávamos assistindo à guerra às 18:30 no jornal, todos os dias. O governo não havia prendido a controlar a mídia nestes assuntos, ainda. Assistimos imagens, diretas, de pessoas explodindo, corpos e sangue, de crianças morrendo ... Tudo isso deu início ao movimento pacifista. Da mesma forma que o movimento dos direitos civis teve seu início com imagens de cães mordendo as pessoas negras. Cães que os policiais e xerifes soltavam e que atacavam os negros no chão. Quando assistimos a essas imagens, o país inteiro acordou”.

Comecei na época das câmeras leves, que de repente estavam seguindo as pessoas, com câmeras leves de 16 mm. Vimos o que pensávamos ser os Maysles (NOTA: os irmãos Albert e David, documentaristas, papas do “cinema direto”, diretores de ‘The Beatles: The U.S. First Visit’ e do controverso ‘Gimme Shelter’, dos Rolling Stones e ) e os sócios de Drew (NOTA: Robert Drew, documentarista americano, adepto do cinema-verdade, famoso pelo filme ‘Primary’, cobrindo as primárias do Partido Democrata ocorridas no estado de Wisconsin entre os pré-candidatos à Presidência John Kennedy e Hubert Humphrey). Estávamos vendo todos esses documentários fabulosos, dizendo: É assim que é a vida. A câmera está pegando tudo. É impressionante’. Assim, o público acreditou. É nesta época que temos a citação famosa de Godard: ‘O cinema é a verdade 24 quadros por segundo’. Digo o inverso, acho que é a mentira 24 quadros por segundo. Sendo um diretor de filmes, sei como é fácil, em documentários como ‘Be Black Baby’ e ‘Hi, Mom!’, você poder manipular as imagens e as pessoas vão acreditar no que você quiser”.

A maior tragédia que eu já presenciei é que a televisão tornou-se só comerciais de informações. A informação programada. Não há mais informação de verdade. Recebemos a informação que eles querem, é como a censura do governo sobre informações. Falam sobre a liberdade da imprensa, mas todas as agências da mídia são controladas por grandes empresas. Vemos o que elas querem que vejamos. No final das contas, foi nos anos 60 que tudo começou a ferver na América: (os 60) marcaram o início do movimento feminista, o início da liberdade política para os negros, muita música excelente, as drogas que expandiam a consciência. Foi uma época realmente fascinante e inspiradora. Muitos dos cineastas da minha geração produziram obras que tornaram-se a base do cinema americano contemporâneo. Eles foram produtos dos 60’s. Grandes artistas têm de estar no lugar certo no momento certo. Nunca perdi meu espírito 60’s”.

Depois de montar o filme (NOTA: ‘Get to Know Your Rabbit’, seu primeiro e frustrante filme – um curta – para a major Warner Bros.), não gostaram do que havia feito, não gostaram das minha mudanças para melhorá-lo ...Então eles ‘me mandaram pra casa’. É interessante o fato de Orson Welles estar naquele filme, porque ele foi um homem que nunca descobriu como se beneficiar do sistema de estúdios. Só que uma parte de produzir filmes é a capacidade de lidar com esse sistema. Os grandes cineastas aprenderam a lidar com ele: Ford, Hitchcock ... Conseguiram trabalhar dentro do sistema e realizar suas extraordinárias visões. Não se pode simplesmente dizer: ‘Sou um artista, eles não me entendem’. Não faz sentido. É uma indústria, administrada por homens gananciosos, e você tem de fazê-los executar o que você quer. Fala-se de ‘Soberba’ (NOTA: ‘The Magnificent Ambersons’, o segundo filme de Orson Welles, rodado um ano depois de ‘Cidadão Kane’, e totalmente mutilado pelos produtores), que é um filme fantástico mas foi destruído. Onde estão as cenas cortadas de ‘Soberba’? Pode-se discutir todas as razões do mundo, eu penso no meu filme todos os dias, no meu estúpido filme curto ‘Get to Know Your Rabbit’. O fato é: a culpa é minha! Eles foram mais espertos do que eu. A mesma coisa aconteceu com Orson Welles. Enfim, meu desejo é: quero assistir a meu filme e estar satisfeito com ele. Somente por mim mesmo. Posso assiti-lo, na tela da minha televisão, e dizer: ‘Aquilo foi ideia minha, e eu a realizei. Vou ficar do lado dele’. O que está errado é o que eu errei. Não foi porque outra pessoa chegou e mudou as coisas”.

(Brian De Palma, em entrevista à TV francesa, à época do lançamento de ‘Femme Fatale’, nos extras de ‘Saudações’ – ‘Greetings’, de 1968 –, seu primeiro longa, lançado em DVD este ano pela Lume. Filho típico dos 60’s, o cineasta americano natural de Newark, New Jersey, que completa 70 anos no próximo 11 de setembro, é parte da brilhante geração que renovou o cinema americano entre o final dos anos 1960/início dos 70 – Copolla, Scorsese, Spielberg. De Palma ainda não teve lançado por aqui seu contundente ‘Redacted’, de 2007, um docudrama ambientado na Guerra do Iraque, rodado em câmeras de vídeo de alta definição, em que episódios como o estupro de uma colegial iraquiana por soldados americanos recebem tanta atenção como o olhar sobre a moderna cobertura jornalística da guerra, como farto uso do universo tecnológico – reportagens em blogs pela web, uso de parafernália digital ...)

Pitacos de filosofia no pop (1)

A prova de que você deve ter bons discos pra fazer bons discos”.

(James Wirth, resenhista britânico, em uma edição antiga – 1996 – do tradicional Rough Guide of Rock, falando sobre os escoceses do BMX Bandits, embrião do Teenage Fanclub – que, a propósito, está de volta com novo disco, ‘Shadows’, mais uma vez mostrando a diferença que faz uma discoteca informada em casa. Tão fundamental quanto simples, tal verdade não transparece na audição da maioria das bandas de rock brasileiras. E gaúchas.)

A morte das gravadoras

O novo e ótimo álbum dos canadenses do Arcade Fire (excelente show em POA em 2005, abrindo pros Strokes no que seria o Pepsi On Stage), ‘The Suburbs’, já estreou em primeiro lugar na parada da Billboard. Vendeu 156.000 cópias só na primeira semana, atingindo um resulatado bem melhor que o anterior, o incensado ‘Neon Bible’ (2007), que quando foi lançando foi adquirido por 92.000 satisfeitos fãs. Desses 156.000 compradores, nada menos que 97.000 adquiriram a obra através de download, pagando apenas U$ 3,99 (!!!!!). Laura Ballance, baixista do Superchunk e uma das proprietárias do excelente selo Merge Records, casa do Arcade e do próprio Superchunk (além de Lambchop, Spoon, Magnetic Fields ...) justifica a bagatela cobrada: “Desvalorizar a música é algo que me preocupa bastante ... Mas é difícil traçar uma linha divisória aí. A essa altura, as pessoas podem fazer o download de graça se elas realmente quiserem. Se você está tentando fazer com que as pessoas comprem música, pessoas que não o fariam de outra maneira, talvez esse seja o jeito. Fazer tão barato que acabe por reequilibrar a balança”.

Enquanto isso, no universo das majors, os tubarões da indústria debatem-se tentando descobrir de que maneira tentarão retomar o controle absoluto que tinham sobre o comércio da música, perdido nos últimos dez anos pro libertário universo virtual.

Não vão. A revolução veio e ficou, esta é a realidade. Bem feito pras grandes corporações. Die, die, motherfuckers!

O baixinho do Simply Red, não, Ronnie, por favor!

Os Faces foram uma das melhores bandas da história do rock de todos os tempos, sem qualquer sombra de dúvida. Tinham tudo o que uma verdadeira banda tem de ter: agressividade, malícia, peso, suíngue, vocalista carismático e de voz rouca e potente, dois guitarristas afiados, cozinha segura, mix de r’n’b barulhento e a melhor soul music, que influenciou até os Stones e mesmo os Pistols (como admitido pelos próprios), além de ter ajudado a forjar o som dos Black Crowes (“ajudar” é generosidade nossa). Só terminaram quando os Stones convocaram Ronnie Wood para substituir o demissionário Mick Taylor – e por essa época Rod Stewart já engendrava sua carreira muitíssimo bem-sucedida (em termos comerciais, é claro).

Well, os Faces resolveram reunir-se mais uma vez, para uma tour pelo Reino Unido. O pontapé inicial foi no Da formação original, apenas Ronnie, o baterista Kenney Jones (que tocaria no The Who após a morte de Keith Moon) e o tecladista Ian McLagen. Na guitarra que foi de Steve Marriott agora está o filho de Ronnie, Jessie, e no baixo, o enjeitado ex-baixista dos Pistols, Glen Matlock. Quanto aos vocais, ... bem, Rod decidiu não participar desse comeback, mais interessado que está nos seus banais discos de covers do cancioneiro popular americano. E então Ronnie e comparsas optaram por convocar ... Mick Hucknall. Sim, ele mesmo, o ruivinho enjoado vocalista do não menos enjoado Simply Red.

O SR e seu cantor baixinho têm lá seus fãs por aqui, e CM, impregnada que é de espírito democrático e libertário, respeita todas as posições contrárias à sua. Mas concorda com a piadinha contida no final de ‘A Festa Nunca Termina’ . E completa: bandas e artistas pop oitentistas que prestavam tributo à melhor soul music americana e iam além, havia várias – Prefab Sprout, Dexy’s Midnight Runners, Scritti Politti, Elvis Costelo ... Entre essas, não está o Simply Red.

Que bola fora, Ronnie.

Tá, mas a gente vai lá só pra beber ou ouvir rock também?

O último Rock In Rio realizado na cidade que lhe dá nome foi o terceiro, e lá se vão quase dez anos. Foi em 2001, e trouxe Foo Fighters, a falecida Cássia Eller (puxando o saco da audiência e de Dave Grohl cantando ‘Smells Like Teen Spirit’), Beck, Queens Of The Stone Age (com Nick Olivieri peladão, vítima da demagogia local, indo dar explicações na delegacia), Sepultura, R.E.M., Red Hot Chili Peppers (chocho pra cacete), Neil Young & Crazy Horse (nada menos que destruidor) e aquela malfadada noite com os fraudulentos Oasis e Guns ‘N’ Roses e seu público jeca cobrindo de garrafas d’água um deslocado e inconveniente Carlinhos Brown – repetindo o que já acontecera nas edições anteriores com Baby & Pepeu e Erasmo Carlos no primeiro, em 1985, e com Lobão em 1991, todos vítimas da fúria metaleira.

Pois agora, Roberto Medina, com aquele mesmo cabelinho escovado e puxado pra trás, tá anunciando a volta do festival à cidade maravilhosa pro ano que vem. Vai rolar nos dias 23, 24, 25 e 30 de setembro, e 1º e 2 de novembro. O vídeo oficial já foi gravado, com uma nova versão daquela musiquinha xarope, agora entoada por figuras como Dinho Ouro Preto, Pitty, Rogério Flausino, Tico Santa Cruz e Ivete Sangalo. Quanto aos artistas que se apresentarão no evento, Medina não confirma ninguém, mas diz que seu sonho é Ter Shakira e Lady Gaga.

A pergunta que insiste em não calar é desnecessária de tão óbvia, mas CM insiste, mesmo assim: o que é que o rock tem a ver com isso?

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

COMPANHIA MAGNÉTICA NO RÁDIO (45)

Sorry, moçada. O playlist do penúltimo programa só vai hoje, com quase uma semana de atraso. Sorry again: neste sábado, 14, também não vai ter programa, pois acontece a cerimônia de encerramento do Festival de Gramado. Mas no próximo, tem especial, um programa inteirinho dedicado aos 'cowpunks' originais, os Meat Puppets, ainda hoje na ativa, mas só com as gravações clássicas dos anos 1980. Enjoy.


1º bloco:

16 HORSEPOWER – South Pennsylvania Waltz

Banda formada em 1992 em Denver, no Colorado, um dos baluartes do chamado ‘alt country’ (o country alternativo), veículo de David Eugene Edwards, cantor, compositor e múlti-instrumentista (ele toca guitarra, banjo e bandoneon), que também tem outro projeto muito bacana chamado Woven Hand, que a gente mostra num dos próximos programas. Edwards é filho de um pastor e a religiosidade do pai o influenciou de maneira decisiva: as letras do 16 Horsepower são carregadas de imagens cristãs e temas como culpa e redenção – ao estilo de Nick Cave, de quem Edwards é fã confesso. Além das referências da música americana de raiz (country, folk, bluegrass), o som do grupo também tinha forte apelo do rock gótico, em especial Joy Division e Gun Club (de quem regravou a clássica ‘Fire Spirit’), o que lhe valeu a fama de Ter criado um novo gênero, o ‘gothic americana’. Por “diferenças pessoais, espirituais e políticas”, a banda se separou em 2005. Deixou um E.P., dois álbuns ao vivo, quatro discos de carreira e uma coletânea excelente chamada ‘Olden’ (2003), com versões nunca lançadas de canções antigas.

BEACHWOOD SPARKS – Confusion is Nothing New
Grupo de Los Angeles, claramente influenciado pelo country rock psicodélico sessentista de Byrds, Love e Buffalo Springfield, formado em 1997, encerrou as atividades em 2002, mas voltou à ativa em 2008. Tem como figuras centrais o baixista Brent Rademaker, que também tem uma outra banda muito legal, chamada The Tyde, e o cantor e guitarrista Chris Gunst, ex-Strickly Ballroom – os dois integravam antes um grupo chamado Further. O Beachwood Sparks tem dois elogiados álbuns, sendo que o primeiro, homônimo, lançado em 2000, tem uma sonoridade mais mais rock, enquanto que o segundo, ‘Once We Were Trees’ (2001), é mais viajandão, tem uma sonoridade mais ‘spacey’ – não por acaso um resenhista definiu o som dos caras como “cosmic country-pop”. Atualmente, os caras trabalham em um novo disco.

UNCLE TUPELO – Gun
Talvez a mais mítica dessas bandas de country alternativo, não só por ter sido uma das primeiras a fundir a fúria punk à música caipira americana, mas também por contar com dois carismáticos cantores/guitarristas/compositores que formaram outras duas bandas que deram o que falar depois: Jeff Tweedey é o líder do incensado Wilco, enquanto que Jay Farrar é o cabeça do Son Volt. O Uncle Tupelo, que tirou seu nome de uma clássica canção gospel, durou apenas 7 anos, deixou quatro cultuados álbuns, incluindo o clássico ‘No Depression’ (1990), cujo título virou sinônimo de artistas de rock alternativo que se voltam para as raízes da música americana, e ‘March 16-20, 1992’, gravado ao vivo em estúdio pelo guitarrista do R.E.M., Peter Buck. Mas o disco que talvez melhor traduza esse mix Hank Williams/Leadbelly/Replacements/Hüsker Dü do grupo seja o segundo, ‘Steel Feel Gone’, de 1991. Com o estremecimento das relações entre Tweedy e Farrar, o UT encerrou as atividades em 1994, com o primeiro levando o baterista original, Mike Heidorn, para o Wilco, e o segundo o seu substituto, Ken Coomer, e os múlti-instrumentistas John Stirratt e Max Johnson para o Son Volt.

2º bloco:

PANDA BEAR – Slow Motion

Incensado projeto do prolífico Noah Lennox, também fundador do quentíssimo Animal Collective e integrante de outros grupos como Jane e Together. O PB faz som eminentemente eletrônico, de referências múltiplas e variadas, e Noah se vira em várias funções: além de ser o cantor de peculiar timbre de voz (começou cantando em corais de igreja nos tempos de colégio), pilota teclados, samplers, toca guitarra e até bateria – na turnê mais recente do Animal Collectvie, era ele o percussionista (se diz influenciado por Stewart Copeland, do Police). O Panda Bear tem três álbuns, sendo que o mais recente, ‘Person Pitch’, de 2007, foi eleito disco do ano pelo site Pitchfork. O novo single, ‘Tomboy’, saiu este mês.

HOW TO DESTROY ANGELS – A Drowning
Nova banda do atormentado Trent Reznor, que deu férias por tempo indeterminado para o Nine Inch Nails ano passado, depois de 20 anos de atividades. O How To Destroy Angles, que tirou seu nome de um single do Coil lançado em 1984, tem ainda a cantora indiana Mariqueen Maandig, mulher de Trent, e o múlti-instrumentista e produtor Atticus Ross, velho colaborador do NIN, e é um projeto novíssimo: iniciou pouco tempo depois do último show do Nine Inch Nails, em setembro de 2009. Segundo os mais rigorosos, trata-se de um Nine Inch Nails com uma mulher no vocal, pois o grupo também faz um rock eletrônico denso, que tem referências que vão do som industrial ao trip-hop, do som gótico à IDM, mas a presença de Mariqueen, que contribui para uma atmosfera mais sensual e onírica, faz toda a diferença. Todo o material lançado pela banda é deste ano: um E.P homônimo de 6 faixas, o singleA Drowning’, colocado na rede para free download, o vídeo de ‘True Believers’ e a faixa ‘The Believers’, disponível num iPad lançado pela revista Wired.

FLYING LOTUS – Mmmhmm
Codinome de um cidadão californiano de Los Angeles chamado Steven Ellison, 26 anos, que fez fama com o tema da animação ‘Adult Swim’, do Cartoon Network, e desde então vem fazendo música eletrônica experimental, com uma penca de referências bacanas: hip-hock, jazz, trilhas de filmes blaxploitation, techno, house, drum’n’bass, IDM ... Ellison geralmente faz a música no seu laptop, manipula tapes e toca-discos, mas no mais recente, ‘Cosmogramma’, lançado em maio deste ano, há também a colaboração de músicos, responsáveis por guitarras, baixos, instrumentos de sopro, cellos, violinos e até harpa. Curiosidade: Ellison é sobrinho de Alice Coltrane, grande compositora e pianista do jazz e viúva do mestre John Coltrane.


3º bloco: LYDIA LUNCH – ‘Queen of Siam’ (1980)

Lydia Koch, 51 anos (nascida em 2 de junho de 1959 em Rochester, Nova Iorque), é uma das personagens mais sui generis da música americana das últimas três décadas: começou fazendo parte da barulhenta cena no wave novaiorquina, gravou um disco com influência do jazz e do pop sessentista, passou a gravar discos apenas falados, atuou em e dirigiu filmes underground, sempre mantendo a postura feroz, provocativa, anti-comercial e niilista. Também teve sua vida marcada pelo uso abusivo de drogas pesadas, em especial a heroína.

Lydia chegou à big apple aos 16 anos, e logo passou a viver em uma comunidade de artistas, onde recebeu seu nome de guerra: como ela tinha o hábito de roubar os almoços dos outros, passaram a chamá-la “Lydia Lunch”. E foi depois de um show do Suicide, no lendário Max’s Kansas City, que decidiu abraçar a carreira musical, formando o Teenage Jesus & The Jerks, grupo noise do qual fazia parte também o saxofonista James Chance. O Teenage e os Contortions, a banda liderada por Chance, fariam parte do clássico álbum-manifesto ‘No Wave’, produzido por Brian Eno, lançado em 1978, e que contava também com o DNA de Arto Lindsay e um grupo chamado Mars. No mesmo ano, Lydia também participou do disco de estreia dos Contortions, ‘Off White’, usando o pseudônimo “Stella Rico”, e também atuou no filme ‘Black Box’, curta-metragem dirigido pelo casal de cineastas indie Scott e Beth B, no qual fazia o papel de uma torturadora. Na sequência, viriam outras participações em filmes underground, sendo o mais notório deles ‘Fingered’, de Richard Kern, em que faz cenas de sexo explícito. Alguns dos filmes dos quais participou ele mesmo escreveu e dirigiu.

‘Queen of Siam’, seu álbum de estreia solo, foi gravado em Nova Iorque em 1979 com arranjos do craque Billy VerPlanck, lendário trombonista e arranjador que trabalhou com big bands famosas como a de Tommy Dorsey, e lançado um ano depois. Tinha também o não menos lendário Robert Quine, e-guitarrista de Richard Hell e Lou Reed, e a própria Lydia, além de cantar suas composisções e versões de clássicos como a lúgubre ‘Gloomy Sunday’ e a solar ‘Spooky’, também faz solos de guitarra em duas faixas. O álbum saiu pelo selo Triple X e foi reeditado em CD ano passado pela gravadora Chery Red. Como todos os trabalhos de Lydia, apesar de elogiado, pouca repercussão teve em termos de vendas.

Dois anos depois, a rainha das trevas da cena novaiorquina lançaria ‘13.13’ com o auxílio de integrantes dos Weirdos, e uma série de colaborações viria, com gente como o Birthday Party de Nick Cave, os alemães experimentais do Die Haut, o Sonic Youth, os alemães nervosos do Einsturzende Neubauten, o maluco Michael Gira, ex- Swans, entre outros. Nos anos 1990, teve um grupo de curtíssima duração com Kim Gordon (Sonic Youth) chamado Harry Crews, homenagem ao escritor cult americano, e seguiu lançando seus discos apenas falados – faceta que dominou sua obra principalmente na primeira metade da década de 2000 –, com parcerias que vão desde sua amiga Exene Cervenka (ex-vocalista do X) ao romancista que deu voz ao submundo novaiorquino, Hubert Selby Jr. (de ‘Réquiem para Um Sonho’ e ‘Última Saída para o Brooklyn’). Sua carreira literária tem resultados controversos, segundo os resenhistas. Em 1997, publicou sua autobiografia, ‘Paradoxia’, em que abordava sem rodeios sua infância, a agitada vida sexual, o uso abusivo de drogas e também seus problemas psíquicos. Seu último disco é do ano passado, ‘Big Sexy Noise’, do grupo homônimo que mantém com James Johnston, Terry Edwards e Ian White.

Mechanical Flattery
Gloomy Sunday
Spooky
Atomic Bongos
Lady Scarface