Doc: ‘Todos dão um estranho valor à minha vida. Diga, Wyatt, quanto ganha? Cerca de U$ 100,00 por mês e U$ 2,00 por prisão?’
Wyatt: ‘Está tentando me subornar?’
Doc: ‘Ah, não. Você, não. Sinto-me obrigado a lhe fazer uma proposta honesta. Tem algum dinheiro guardado?’
Wyatt: ‘Algum’.
Doc: ‘Vai comprar um rancho ou uma loja no campo um dia? Bem, vou tornar mais fácil pra você: você me banca em U$ 1.000,00 e divido meus lucros. Os vaqueiros estão vindo e o jogo será alto.’
Wyatt: ‘50-50, hein?’
Doc: ‘Na verdade, um monte de gente ficaria feliz em me bancar por 10%, mas gosto de você, Wyatt Earp. Gosto do seu estilo.’
Wyatt: ‘Por que a generosidade na divisão?’
Doc: ‘Um barbeiro precisa disso (mostra a lâmina de barbear que tem na mão). Um homem da lei, de uma arma. Sou um jogador. Dinheiro é só uma ferramenta pra mim.’
Wyatt: ‘Claro, vai garantir que nunca perderá.’
Doc: ‘Nunca perco. Pôquer é um jogo para desesperados que amam dinheiro. Não perco porque não tenho nada a perder, inclusive minha vida. De acordo?’
(Doc Holiday/Kirk Douglas e Wyatt Earp/Burt Lancaster, a mais mítica dupla de heróis do velho oeste, em ‘Sem Lei e Sem Alma’ – infeliz tradução para o clássico ‘Gunfight at O.K. Corral’, dirigido por John Sturges em 1957. Mítica e improvável – ou talvez nem tanto, dada a larga tradição do cinema americano em explorar a colaboração, vacilante no início, quase familar ao final, entre opostos: Wyatt Berry Stapp Earp, o ilibado e temido xerife de fronteira, e John Henry ‘Doc’ Holiday, dentista por formação, jogador de pôquer por vocação, exímio atirador – segundo Earp, ‘o mais veloz e mortal homem com uma arma na mão’ que viu em toda sua vida. Sujeito culto, elegante, mas atormentado, entre outras coisas, por uma tuberculose que o levou à dependência do álcool como forma de aliviar as dores da doença, Doc foi um daqueles personagens da vida real que acabaram tornando-se, fácil, fácil, prato cheio para o cinema. Vaidoso, mas vulnerável, com enorme facilidade para entrar em encrencas e, consequentemente, colecionar inimigos, tinha outro trunfo importantíssimo nos vários duelos à bala em que se meteu: dono de uma frieza inacreditável, segundo se diz, era capaz de manifestar profunda indiferença em situações-limite. O famoso tiroteio do O.K. Corral – localizado em Tombstone, no Arizona –, um dos episódios mais marcantes do imaginário americano de qualquer época, deu-se em 26 de outubro de 1881: um acerto de contas entre Wyatt e seus irmãos, Virgil, Morgan e James, reforçados de Doc, e o bando do criminoso Ike Clanton. O evento todo, que deixou como saldo três mortos do lado de Clanton, durou pouco mais de um minuto, mas, no filme de Sturges – realizador de ‘Sete Homens e Um Destino’ –, é valorizado ao extremo, desde os acontecimentos que levaram ao conflito, passando pela expectativa até chegar à execução. O famoso entrevero motivou vários filmes: ‘Wyatt Earp’ (1994, dirigido por Lawrence Kasdan, com Kevin Costner como o xerife e Dennis Quaid como Doc), ‘Tombstone’ (também de 1994, com direção de George Pan Cosmatos e a dupla Kurt Russell, como Earp, e Val Kilmer, como Doc) e até uma outra versão, tida como mais fiel aos acontecimentos, do próprio Sturges, ‘Hour of the Gun’, rodada dez anos depois de ‘Sem Lei ...’, com James Garner/Wyatt e Jason Robards/Holiday. Isso sem falar em ‘Paixão dos Fortes’, um dos grandes filmes de John Ford, o mestre definitivo do Western, como outros tantos rodado no Monument Valley, e com a dupla Henry Fonda – perfeito como o probo Earp – e, pasmem, Victor Macture – o canastrão tem no registro correto de Doc Holiday 'a' performance de sua modesta carreira.)
O boêmio Holiday/Douglas: com o certinho Earp/Lancaster, formou a dupla dinâmica do velho oeste, páreo duríssimo pra bandidagem
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