Alguns dos melhores relançamentos de 2010 até o final da primeira quinzena de agosto:
SERGE GAINSBOURG & JANE BIRKIN – ‘Serge Gainbourg et Jane Birkin’ (1969)
Clássico da sacanagem chic de um eterno provocador e sua então musa, a atriz inglesa, futura mamãe da descolada Charlotte. É deste disco a música mais conhecida do figuraça Serge, ‘Je T’Aime Moi Non Plus’, tema do filme dirigido por ele mesmo – lançado este ano no Brasil em DVD pela Lume –, ‘Paixão Selvagem’, que traz o antigo dançarino da troupe de Andy Warhol, Joe D’Alessandro, como um caminhoneiro gay que desenvolve uma obsessão apaixona por uma garota (Jane) de cabelos curtíssimos e aparência quase infantil – daí que ele a sodomiza o tempo todo, fantasiando que está se relacionando com um garoto. Gainsbourg é único.
QUEENS OF THE STONE AGE – ‘Rated R’ (2000)
Melhor disco da banda, ganhou agora a tradicional edição DeLuxe – disco duplo, com uma cacetada de faixas bônus. No caso, um show inteirinho de Josh Homme e comparsas à época. ‘R’ é o disco mais equilibrado e conciso do QOTSA, com riffs ganchudos, barulheira na medida, experimentalismos sutis. É deste disco o hino ‘Feel Good Hit of the Summer’ (aquela canção que desfila o nome de uma série de drogas), mas tem ainda ‘Monsters In the Parasol’, ‘The Lost Art of Keeping a Secret’, ‘Auto Pilot’, ‘Parasol’, ‘Better Living Through Chemistry’ ... Stoner Rock do melhor. O disquinho adicional traz todos os lados B dos singles, além doarrasador show dos caras no Festival de Reading do ano. A edição especial, comemorativa aos 10 anos de lançamento, melhorou o que já era excelente, e até a capa ficou mais atraente: saem o azul (que compunha com preto e branco a combinação mais horrorosa que se conhece) e entra o vermelho. O super power trio arregimentado com pompa e circunstância por Josh no ano passado – o Them Crooked Vultures, com Dave Grohl e John Paul Jones – não chega nem perto disso aqui.
R.E.M. – ‘Fables of Reconstruction’ (1985)
Terceiro disco da banda de Michael Stipe, aquele famoso álbum de transição – no caso, de uma banda que tinha causado sensação com seus dois primeiros álbuns e o E.P. de estreia com um energético college rock de tintas rurais. ‘Fables of Reconstruction’ (ou ‘Reconstruction of Fables’, dá no mesmo) claramente procura novos caminhos, com o auxílio de metais, arranjos de cordas e um certo estranhamento. Curiosidade: foi o primeiro a sair no Brasil, em vinil, por uma tal ‘New Rock Collection’ (com as famosas tarjinhas amarelas ornamentando as capas), que também lançou Prefab Sprout, Lone Justice, Big Audio Dynamite. Longe de ser o melhor, é, por outro lado, um dos discos mais curiosos do R.E.M. Tem os hits ‘Can’t Get There From Here’ e ‘Driver 8’, e a estranhona ‘Feeling Gravity’s Pull’, que abre o disco, além das bacanas ‘Maps and Legends’, ‘Life and How to Live It’, ‘Auctioneer’, ‘Old Man Kensey’, ‘Green Grow the Rushes’.
JUNIOR MURVIN – ‘Police & Thieves’ (1977)
Clássico do reggae do cantor de jamaicano de Port Antonio de timbre peculiar, cuja faixa-título é mais conhecida por aqui na versão do Clash – que, usando o mesmo produtor (o bruxo do dub, Lee ‘Scratch’ Perry), registrou-a no mesmo ano, em seu álbum de estreia. Mas a obra não resume-se à evidentemente marcante faixa-título: ‘Roots Train’, ‘Solomon’, ‘Lucifer’, ‘I Was Appointed’ e outras pérolas do groove garantem a paz espiritual do ouvinte.
CURE – ‘Disintegration’ (1989)
O último grande disco do Cure – e lá se vão mais de 20 anos. Melancólico e pop, ‘Disintegration’, disco de cabeceira de uma geração de músicos americanos e ingleses, soa quase que como um mix do pop de ‘Head On The Door’ e o pesadelo de ‘Pornography’. Pop sombrio pra tocar no rádio, como só Bob Smith e cia. sabiam fazer: anos depois, Robert Smith reuniu o repertório do pesadão ‘Pornography’ (1982), o deste e o de ‘Bloodflowers’ (2000) numa série de shows em Berlim, ‘Trilogy’ (espécie de trilogia gótica). A presente edição especial é mais do que luxuosa: virou um álbum triplo, em que às canções originais (clássicos como ‘Pictures of You’, ‘Love Song’, ‘Lullaby’ e ‘Fascination Street’), remasterizadas, juntam-se e um disco só com demos, ensaios e versões alternativas das músicas registradas e ainda, créme de la créme, show inteirinho da época, realizado em julho de 1989 no velho Wembley, com todas as canções tocadas na mesma ordem do álbum. Vale a pena se endividar por esse brinquedinho aqui.
PAVEMENT – Quarentine The Past (2010)
Não é propriamente um relançamento, uma vez que as canções estão aqui agrupadas desta maneira pela primeira vez, mas trata-se da coletânea definitiva da banda, que desde o ano passado voltou a se apresentado no hemisfério norte – mas já avisou que não vai retomar a carreira nem lançar música nova. O que faz de ‘Quarentine’ ainda mais essencial: o Pavement é a quintessência da guitar band indie da primeira metade dos anos 1990, com senso de humor (às vezes até maldoso, como em ‘Range Life’), dissonância e aquele estilo chapado/largadão bem próprio da época. Alguns clássicos ficaram de fora, o que seria inevitável, mas o acerto na escolha foi justamente privilegiar raridades difíceis de encontrar, pois foram lançadas só em singles e outras coletâneas – mas de qualquer maneira ‘Summer Babe’, ‘Gold Soundz’, ‘Stereo’, ‘Shady Lane’, ‘Here’, ‘Trigger Cut/Wounded-Kite At :17’ estão aqui, reluzentes. É bala.
THE FLESHTONES – ‘It’s Super Rock Time! The I.R.S. Years – 1980-1985’ (2010)
Outra coletânea caprichada, de uma banda veterana – a origem remonta ao Queens novaiorquino no ano de 1976 –, focando seu período clássico, a primeira metade dos anos 1980, em que eram uma das principais estrelas do selo I.R.S., que fez fama por revelar o R.E.M. O protopunk regado a muito r’n’b clássico dos Fleshtones, liderados pelo carismático Peter Zaremba (ex-apresentador da MTV americana), pegam na veia, em faixas como ‘I’ve Got to Change My Life’, ‘R-I-G-H-T-S’, ‘Roman Gods’ e ‘American Beat’ – essa última incluída na trilha da comédia teen “Despedida de Solteiro”, em 1984. Abriam tanto os shows do Blondie e dos Ramones, quanto de Chuck Berry e de James Brown.
THE UNITS – 'The Early Years: 1977-1983' (2007)
A compilação foi originalmente lançada há três anos, coincidindo com os 20 anos das primeiras gravações, mas tá sendo reposta agora no mercado gringo. Os californianos Units froma uma das primeiras bandas de ‘synthpunk’ da história, surgida poucos anos depois do Suicide em San Francisco – mas os sintetizadores dos caras soavam como guitarras distorcidas em faixas como ‘High Pressure Days’. Seus shows eram lendários, com direito a projeção de filmes anti-stablishment feitos por eles próprios.
IGGY & THE STOOGES – 'Raw Power' (1973)
É provável que este terceiro disco do Iguana e seus comparsas não seja o melhor do grupo – o segundo, ‘Fun House’, que acaba de completar 40 anos de lançamento, . Mas também não faz muita diferença: ‘Raw Power’ é tão essencial tanto. Mais alucinado, mais barulhento, é uma catarse sem precedentes no rock, uma cacetada que nem Iggy nem ninguém conseguiu repetir. Um crítico brasileiro, certa vez, resenhando o (bom) ‘Instinct’, torcendo o nariz para a bolabcha gravada por Iggy em 1987, forçou a comparação: “tente marcar as músicas batendo o pé em ‘Raw Power’ ... Impossível”. Melhor definição jamais ouvi. Rock’n’Roll mais animal também não: ‘Search and Destroy’, ‘Your Pretty Face is Going to Hell’, ‘Penetration’, ‘Raw Power’, ‘I Need Somebody’ ... tem até uma baladinha mais ou menos delicada – mas não muito, saca o título: ‘Gimme Danger’. A nova Legacy Edition acrescenta várias bônus (muitas das quais os fãs tão carecas de conhecer) e a mixagem original do produtor e salcvador da pátria, David Bowie. Quem não conhece, vai pirar. Quem já conhece ... jamais se recuperou. Me dá mais! Me dá mais!
MODEST MOUSE – The Moon & Antarctica (2000)
Mais uma edição comemorativa – no caso, de dez anos de lançamento do primeiro disco por uma grande gravadora de uma das principais bandas alternativas americanas dos últimos quinze anos. Se toda transição para uma major de um respeitado grupo indie fosse assim ... O esquisitão Isaac Brock e seus escudeiros entregam um álbum mais polido, menos áspero que o clássico ‘Lonesome Crowded West’, mas a densidade e o estranhamento são os mesmos. ‘Dark Center of the Universe’ sempre foi minha preferida, mas tem ‘Gravity Rides Everything’, ‘3rd Planet’, ‘Tiny Cities Made of Ashes’, ‘Paper Thin Walls’, ‘I Came As a Rat’ ... O Modest Mouse depois partiu para um som mais suingado, aparentado dos Talking Heads, e chegou a ter o lendário Johhny Marr, ex-guitarrista dos Smiths, em sua formação. Um novo álbum não deve estar longe.
WILLIE COLÓN & RUBÉN BLADES – 'Siembra' (1978)
Tem preconceito com a latinidad? Bota esse pra tocar, então. Começa com um chacundum que é pura disco music, em ‘Plástico’, depois cai na mais arrebatada salsa. O politizado Bladés está aqui no auge da forma, criticando a sociedade de consumo norte-americana na citada ‘Plástico’, descrevendo o modo de vida terceiro-mundista em ‘Pedro Navaja’ ... A dupla Colón (novaiorquino do Bronx) e Blades (apelidado de “o Bruce Springsteen panamenho”), que teve longa colaboração, quebraria os pratos tempos depois, mas só por esse estupendo álbum, ponto alto do som latino dos anos 1970, já se justificaria.
ROLLING STONES – ‘Exile On Main St.’ (1972)
Fechando a lista, aquele disco de rock/múcia pop com o qual nada que foi ou venha a ser lançado ou relançado neste ano e nos próximos 50 possa ser comparado – até porque os Beatles já passaram por seus “Remaster’, assim como Jimi Hendrix, Bob Dylan e o Velvet Underground. A história das gravações e o conturbado período por que passavam os Stones – fuga do implacável e cruel fisco britânico, os problemas com a lei, o romance sério de Keith, Anita Pallenberg e a heroína ... tudo isso tá contado no livro ‘Uma Temporada no Inferno com os Rolling Stones’, de Robert Greenfield (saiu pela Zahar Editor em 2008), e no documentário ‘Stones In Exile’, que chega ao mercado paralelamente ao disco. Mas ‘Exile ...’, um dos poucos álbuns duplos da história do rock que não traz um mísero instante supérfluo, é uma experiência que tem de ser sentida, não pode ser descrita. Bom, ajuda dizer que ‘Tumbling Dice’, ‘Loving Cup’, ‘Happy’ (uma das melhores canções defendidas por Keith em toda a discografia do grupo), ‘All Down The Line’, ‘Rocks Off’, ‘Shine a Light’, as esquisitonas ‘I Just Wanna See His Face’ e ‘Ventilator Blues’ estão aqui, ao lado de outras 10 pérolas – agora remasterizadas no capricho (o som denso e sujo do grupo então era uma armadilha e tanto, plenamente desviada nesta edição Deluxe) que ganhou a companhia de um disquinho a mais só de bônus da época (mais 10 faixinhas). Sempre achei que meu preferido era ‘Let It Bleed’, agora já não sei mais. O certo mesmo é que os Stones, mesmo recheando sua trajetória de canções clássicas nos últimos 38 anos, jamais conseguiram lançar um álbum tão perfeito, supimpa como este aqui. Nem eles, nem ninguém.
PS – conferir também álbuns antigos de Jon Spencer Blues Explosion e St. Etienne que voltam ao mercado.
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