ROLLING STONES
O verdadeiro filé da discografia dos Glimmer Twins já havia sido relançado em 2002, quando do aniversário de 40 anos da mais longeva de todas as bandas de rock: os discos dos gloriosos primeiros dez anos de carreira. Quem tinha as edições antigas em CD de álbuns como ‘Aftermath’, ‘Out of Our Heads’, ‘Beggars’ Banquet’, ‘Their Satanic Majesties Request’ e ‘Let It Bleed’ e depois ouviu a remasterização lançada em Super Audio CD, sabe o quanto um nobre produto lançado com desleixo pode ganhar vida nova – ou recuperar as peculiaridades que lhe deram a justa fama: o som musculoso, a sujeira e a malícia dos timbres originais. A nova leva traz discos, em sua maioria, daquela fase em que o grupo havia muito já se consolidara, carregando o manjado título de "maior banda de rock do mundo": álbuns entre medianos e bons, alguns ótimos, mas longe das obras-primas dos 60’s e início dos 70’s. Mas tem pelo menos um clássico no pacotão da gravadora Universal: ‘Sticky Fingers’ (1971), soberana obra-prima da famosa capa do zíper desenhada por Andy Warhol e clássicos do porte de ‘Brown Sugar’, ‘Wild Horses’, ‘Sister Morphine’, ‘Dead Flowers’, ‘You Gotta Move’, ‘Can’t You Hear Me Knockin?’, ... uma melhor que a outra. ‘Black and Blue’ (1976) e ‘Some Girls’ (1978) são os melhores entre os demais: o primeiro tem a levada black de ‘Hey Negrita’ e ‘Hot Stuff’, além de uma das tradicionais baladas cafajestes do grupo - uma das melhores de todo o catálogo - , ‘Fool to Cry’; no segundo, que traz a famosa foto do quinteto travestido, os caras espertamente "modernizam" seu rhythm’n’blues, sugando a seiva das duas principais ondas daquele momento: ‘Miss You’ tem levada disco (à la ‘Good Times’, do Chic, que também serviu de fonte de inspiração - pra dizer o mínimo - de ' Another One Bites the Dust', do Queen, e 'Another Brick in the Wall', do Pink Floyd), enquanto que a faixa-título tem uma distorçãozinha a mais nas guitarras que claramente emula o punk que os defenestrou. ‘Tattoo You’ (1981) também é um baita disco, com as famigeradas ‘Star Me Up’ e ‘Waiting On a Friend’, mais as energéticas ‘Hang Fire’ e ‘Little T & A’ (esta, cantada por Keith), a levada afro de ‘Slave’ e a climática ‘Heaven’. Merecem atenção também ‘Goats Head Soup’ (1973), com a sacana ‘Angie’, e ‘It’s Only Rock’n’Roll’ (1974), mas esses são discos que já mostram uma banda auto-indulgente, acomodada em seu trono. ‘Emotional Rescue’ (1980), apesar de boas músicas como a faixa-título e ‘She’s So Cold’, e ‘Undercover’ (1983) são álbuns meia-boca, se tanto. E também estão no pacote álbuns da empresa que mantém a lucratividade dos respeitáveis senhores se multiplicando ainda nos dias de hoje, como ‘Dirty Work’ (1986), ‘Steel Wheels’ (1989), ‘Voodoo Lounge’ (1994), ‘Bridges to Babylon’ (1997) e ‘A Bigger Bang’ (2005), registros burocráticos, só pra cumprir tabela – a pedra continua rolando, mas hoje cria limo. A maioria desses últimos vale apenas pros fanáticos, doentes, completistas. O fã mais criterioso vai preferir os álbuns até ‘Exile On Main Street’ (1972), que é quando a carreira dos Stones realmente tem relevância. (Toque adicional de CM: sobre as gravações de 'Exile ...', álbum originalmente duplo em vinil – , saiu este ano o livro ‘Uma Temporada no Inferno com os Rolling Stones’, em que o jornalista Robert Greenfield reconstitui a epopéia orgiástica de Keith Richards – especialmente este, que isolou-se em um castelo suíço pra desintoxicar-se – e colegas, na gravação daquele que é de fato o último álbum de exceção. O álbum, inclusive, deve ser o próximo a sair remasterizado, em edição no capricho, dupla, até o final do ano).
O filé do novo pacotão stoneano remasterizado: nesses aqui, vale a pena investir
LOU REED
Acaba de ser relançado um dos discos mais peculiares do cronista do submundo novaiorquino: ‘The Blue Mask’ (1982). Lou recém saía de um período de lama absoluta, atolado no álccol e nas drogas (várias, em especial as então inseparáveis anfetamina e heroína), e as canções, naturalmente, são influenciadas por esse clima. Além disso, o álbum (o nono de estúdio em dez anos de carreira solo, iniciada em 1972, dois anos após a saída do Velvet Underground) traz, talvez, as interpretações mais tocantes de sua carreira, e uma das melhores formações com quem gravou, no esquema duas guitarras (aqui, ele volta ao instrumento, que abandonara nos álbuns anteriores)/baixo/bateria: o virtuoso Fernando Saunders (baixo), o firme Doane Perry (bateria) e um dos melhores guitarristas a surgirem da quentíssima cena do C.B.G.B., o ex-Voidoids de Richard Hell, Robert Quine – com quem o genioso Reed se desentenderia depois, chutando-o da banda. O clima, em termos de som, lembra muito a fase ‘Rock’n’Roll Animal’ (o ruidoso disco ao vivo de 1974), mas sem aquele clima decadente todo – como dissemos antes, ‘The Blue Mask’ é o statement de um homem renascido (ou querendo renascer). Destaques: a singela ‘My House’, a furiosa ‘The Gun’, o clima de auto-análise da faixa-título e a paranóia de ‘Waves of Fear’. Reed gravou ótimos álbuns na sequência – ‘Legendary Hearts’ (1983), o bem-sucedido ‘New Sensations’ (1984) – e atravessaria a virada da década em alta, com os excelentes ‘New York’ (1989) e ‘Magic and Loss’ (1992, disco conceitual, uma reflexão sobre a morte, influenciado pelo passamento de amigos como o compositor Doc Pomus), além da histórica volta da parceria com o desafeto John Cale, na homenagem ao falecido Andy Warhol, ‘Songs For Drella’ (1990).
O Lou Reed do começo dos anos 1980: adeus, vida bandida
DAVID BOWIE
Tá saindo remasterizado seu ‘Space Oddity’, de 1972. Este disco, puxado pela indefectível faixa-título ("Grounds Control to Major Tom/Taken Your Protein Pills ans Put Your Helmet On"), que serviu de trilha sonora para a transmissão da chegada do homem à Lua em 1969 pela BBC, era já, portanto, uma reedição: o álbum original, ‘Man of Words/Man of Music’ é de 1969. Embora não possa nem de longe ser comparado à gloriosa década de 1970, em que lançava um clássico atrás do outro (‘Hunky Dory’, ‘Ziggy Stardust’, ‘Station to Station’, o tríptico berlinense ‘Low’/‘Heroes’/’Lodger’), já marca a primeira das inúmeras transformações do camaleão, que então deixava pra trás a insossa herança dylaneana e embarcava numa trip folky psicodélica, que rendeu momentos como a referida faixa-título e outros clássicos como ‘Memory of a Free Festival’ (primeira colaboração com o guitarrista dos Spiders From Mars da fase Ziggy Stardust, o ótimo Mick Ronson), ‘The Wildboy Eyed Boy from Free Cloud’, ‘God Knows I’m Good’, ‘Cygnet Committee’ ... Curiosidade: esta última, uma longa e amarga canção de 9 minutos, não apenas prenuncia o punk, ao constatar o esfacelamento do sonho hippie, como um de seus versos ("the guns of love") serve pra batizar duas das principais bandas londrinas que rachariam o rock ao meio em meados dos 70’s, os Sex Pistols e o Damned. Bowie, que reinaria absoluto entre 1970 e 1980, influenciando literalmente todo mundo interessante que veio depois, no final dos 60’s produzia sua primeira proeza.
O Bowie do final dos 60's/início dos 70's: Deus sabe como sou bom
(e em breve vou virar o cara mais cool do planeta!)
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